domingo, abril 27, 2014

Largo do Seminário
HOJE
É 
DOMINGO

(Na minha cidade de Santarém em 27de Abril de 2014)











Hoje, Domingo, dia 27 de Abril de 2014, estamos ainda na onda das comemorações do 25 de Abril de 1974 tanto mais que este ano foram 40 os que passaram e todos nós temos uma atracção irresistível pelos números redondos acabados em zero.

Infelizmente, não vivi esse dia em Portugal porque estava no local errado no dia errado mas, como foi uma opção minha de vida nada a dizer. Em contrapartida permitiu-me outras experiências como a de assistir ao nascimento de um novo país na África Oriental chamado Moçambique.

Nesse dia, na cidade da Beira, eu, mais do que alegria, senti apreensão pelo que iria acontecer mas não passou disso mesmo. 
Sempre existiu em mim uma certa ingenuidade a toldar-me a inteligência, uma espécie de vírus de esperança de que tudo irá correr sempre bem mesmo quando tudo faz desconfiar de que não venha a ser bem assim.

Recriminei-me porque transmiti esperanças a pessoas que talvez tenham acreditado em mim e adiado decisões que as tenham prejudicado, mas era o que sentia e pensava naquele contexto social e político no momento.

No dia da independência de Moçambique eu, que tinha colaborado na organização dos festejos, meti-me no carro com uns amigos e saímos da cidade. Fomos para o campo discretamente. Não quis estar presente, aquela festa não me pertencia embora concordasse com ela mas, bem vistas as coisas, era como dizia o camarada Samora Machel:

- “Eles não nos deram a independência. Nós, é que ganhamos a guerra.”

E era verdade, eu estava de acordo com ele o que me colocava do lado dos vencidos e, sendo assim, não me era possível ir para a festa bater palmas à derrota dos meus compatriotas porque, entre eles, estavam mortos, feridos e estropiados que mereciam o meu respeito, as minhas condolências.

Anos antes, na guerra de Angola, eu poderia ter sido também, um desses mortos, feridos ou estropiados.

Palmas, teria eu batido no dia 25 de Abril de 1974 se estivesse na minha terra porque nada merece mais ser festejado do que o restabelecimento da liberdade como aconteceu com a Revolução dos Cravos que espantou o mundo porque jamais, em tempo algum, se fez um golpe militar em simultâneo com uma Revolução com flores espetadas no cano das espingardas coisa de tal forma inédita que o mundo perplexo e espantado aplaudiu.

O encarnado dos escravos é muito mais bonito do que o vermelho do sangue e as lágrimas de alegria mil vezes preferíveis às da tristeza e da dor.

Vivemos, nesses dias,em Portugal, culminados no 1 de Maio de 1974, Dia do Trabalhador, a maior bebedeira de felicidade colectiva pelos motivos mais certos que algum povo já viveu mesmo que, na realidade, e como sempre acontece nesses momentos, tivéssemos muitos motivos de apreensão sobre o futuro... mas que importava isso para quem se sentia tão feliz?

Tudo está bem quando acaba em bem e pelos jornais da europa e do mundo, nesse dia e seguintes, não foram fotografias de cadáveres espalhados pelas ruas, de caras ensanguentadas, que foram dadas à estampa como sempre acontece com as revoluções, mas sim, o de pessoas, multidões, praças inteiras, abraçadas, esfuziantes de alegria e cravos, muitos cravos, quase todos vermelhos...

Não sei quantos anos ainda irei festejar a Revolução de Abril de 1974 e recordar as palavras do Salgueiro Maia na parada do Quartel, aqui ao pé de mim, em Santarém, às primeiras horas da madrugada desse dia, antes de partir para Lisboa:

 - “Soldados, há várias espécies de Estados: os Sociais, os Corporativos e o estado a que este chegou. Quem quiser vir comigo a Lisboa por termo a isto dê um passo em frente”... e lá foram eles.

... Mas enquanto for vivo sempre me empolgarei porque foi o dia mais bonito que este país já viveu. Lamento não ter estado presente e participado.

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