segunda-feira, junho 23, 2014

POR ISSO…

POR ISSO…







A língua portuguesa é rica de sinónimos, de frases e expressões idiomáticas e até de simples palavras que ditas com entoação diferente significam coisas diferentes.

Na minha juventude, quando estudava em Lisboa, hospedava-me numa casa particular de duas senhoras, mãe e filha, ambas viúvas, ali ao Príncipe Real, junto ao meu Instituto, a dois passos da Baixa e a um passo do elevador da Glória que nos levava até lá.

Nessa casa, para além de um colega meu já falecido, vivia também um senhor suíço, do sector alemão, cabelos brancos e testa larga, Emílio de seu nome, que nos seus oitenta anos sempre bem dispostos repartia as alegrias da vida pelo seu amor à ópera e aos americanos, que tinham libertado a Europa do jugo nazi e por quem ele ficara reconhecido para o resto da vida.

No Verão, partia regularmente de férias até à sua Suiça para confraternizar com os seus irmãos, todos mais velhos que ele. Trabalhava na Baixa, numa casa comercial como tradutor pois era, àquela época em que a China ainda não tinha entrado no comércio internacional, poliglota. 

Os seus oitenta anos de vida tinham sido repartidos em partes sensivelmente iguais pelo seu país, cantão alemão, Itália, França, Espanha e finalmente Portugal, sempre a fugir às guerras embora, da sua vida, pouco ou nada soubéssemos porque ele nada contava… (não era linguareiro como nós).

Dominando fluentemente alemão, italiano, francês, espanhol e português, aprendidos no dia a dia da sua vida em cada um destes países, para além do inglês que foi aprendendo, ele era um curioso pesquisador de palavras que podem dizer isto, mas também aquilo e aquele outro e divertia-se muito com isso.

A história que ele contava e terminava com sonoras e prolongadas gargalhadas pondo à mostra o seu luzidio dente de ouro era esta:

 - “Um jovem namorava uma rapariga visitando-a regularmente em casa dos pais dela como era de bom-tom e se usava nessas épocas mas, ao contrário do que se esperaria, sem qualquer espécie de vigilância ou acompanhamento.

Em vez de olhares atentos, os pais da moça pareciam fazer questão em deixá-los o mais à vontade possível. O rapaz estranhava mas aproveitava… até que chegámos ao dia do casamento, mais concretamente à noite de núpcias que foi passada em casa dos sogros.

À noite, já consumado o casamento, o rapaz agora já marido, levantou-se da cama e em fato de pijama, mãos nos bolsos do casaco, pôs-se a andar no corredor da casa, de uma ponta à outra, interrompendo regularmente o “passeio” para suspirar alto e bom som dizendo: por isso…por isso… por isso…

O sogro que não conseguia dormir com tantos por “issos” levantou-se, encarou o genro e desabafou:


 - "Por isso, por isso, por isso"… Quais por isso nem meios por isso, quando casei não encontrei isso e nem por isso me pus com isso..."  

Site Meter