Religiões |
Falando sobre
Religiões…
Nasci e a religião caiu-me, literalmente,
Dir-se-ia que eu era uma criança
católica, no entanto, não passava de uma criança filha de pais católicos da
mesma forma que seria islamita se tivesse nascido de pais islamitas no Afeganistão
e assim, para mim, o islamismo era falso e o cristianismo verdadeiro e o
contrário para o menino islamita.
A religião começa, pois, por ser uma
herança cultural que os nossos pais nos transmitem ao nascer exactamente como
fizeram com eles, com o apoio da estrutura social, maior ou menor, em função da
sociedade de que fazemos parte.
E, como qualquer herança, quem a recebe
toma-a como sua e assim, sem que pudéssemos ter tido uma palavra a dizer por
sermos demasiado crianças, passamos a ter uma religião e a ser religiosos para
o resto da vida com mais ou menos convicção ou mesmo sem convicção nenhuma e
isto ao longo de gerações e gerações.
Entre nós, parece que a religião como
legado tem vindo a perder valor pois, para além da crise de vocações de que a
hierarquia da Igreja tanto se queixa, também o nível de conhecimento de
aspectos básicos da religião católica anda muito por baixo.
Em 300 entrevistas efectuadas em Maio há
poucos anos na Universidade Lusófona, a maioria dos entrevistados revelou um
confrangedor desconhecimento sobre as datas em que se celebram os feriados
religiosos da Páscoa, Corpo de Deus e Imaculada Conceição, quem é a Santíssima
Trindade, qual é o primeiro Mandamento ou como se chama o Papa, e sobre outras
religiões o panorama não é diferente.
A religião do Dalai Lama revelou-se um
mistério, apenas 18% souberam responder mesmo quando o líder Tibetano tinha
acabado de visitar o país, e às perguntas sobre o Islão, se era uma religião
monoteísta e qual a sua principal cidade santa, a maioria nem tentou responder.
Talvez um pouco por tudo isto o
mediático Frei Bento Domingues se sinta na necessidade de escrever artigos
intitulados “A religião não vai morrer”.
Como português, também eu recebi como
herança dos meus pais, de resto foi a única para além do Curso que o meu pai me
pagou com muito sacrifício, a religião católica e todos os seus sacramentos de
vinculação me foram ministrados: baptismo, comunhão simples, comunhão solene,
crisma e a sagrada união matrimonial.
Durante a minha juventude, enquanto
aluno dos jesuítas, rezei terços, confessei-me, comunguei fiz retiros
espirituais e peregrinações a Fátima.
Debalde, ao longo dos anos a religião
foi perdendo sentido e tornou-se um monte de contradições e equívocos à luz do
bom senso e de princípios elementares de inteligência e raciocínio reduzida a
que ficou a uma crença… uma simples crença… acredito porque sim.
Incapaz de me tornar adepto incondicional
do que quer que seja pela crença, para alem dos valores da liberdade e respeito
pela dignidade da pessoa humana em que acredito indiscutivelmente, fiquei
entregue a mim mesmo e, surpreendentemente, sinto-me bem e morrerei em paz
quando chegar o momento porque não terei que me interrogar sobre o que me
esperará exactamente porque nada estará à minha espera.
Ninguém nem nenhuma leitura em especial
foram decisivos naquilo que sou hoje: crente na vida, descrente em Deus.
Imagine-se um mundo sem religião com as
torres gémeas, sem bombistas suicidas, sem ataques ao Metropolitano de Londres,
sem cruzadas, caça às bruxas, divisão da Índia, guerras de Israel /Palestina,
massacres de sérvios/croatas/muçulmanos, perseguição de judeus enquanto
“assassinos de Cristo”, “assassinatos por motivos de honra”, televangelistas de
fato lustroso e cabelo armado a tosqui ar
o dinheiro de rebanhos ingénuos (“Deus quer que dê até doer”…)
Imagine-se um mundo sem “talibãs” a fazerem
explodir estátuas antigas, decapitações públicas de blasfemos, flagelação de
mulheres por exibirem um centímetro de pele, imagine-se tudo isto e muito mais
e facilmente se compreende porque, tendo nascido filho de pais católicos, não
só deixei de o ser como também não sou crente em Deus.
Acrescentar, porque é justo e
importante, que entendi a teoria evolucionista de Charles Darwin como a
explicação racional para o desenvolvimento da vida ao cimo da terra através dos
fenómenos de mutação e selecção natural, teoria esta que hoje deixou de o ser por
se ter constituído numa verdade científica obviamente comprovada.
“A vida é uma extraordinária
oportunidade e eu que vou morrer considero-me bafejado pela sorte porque a
maior parte das pessoas nunca vai morrer porque nunca vai chegar a nascer. As
pessoas potenciais que poderiam ter estado aqui
no meu lugar, mas que na verdade nunca verão a luz do dia, excedem em número os
grãos de areia que existem no deserto do Sara.
Seguramente que nesses fantasmas que nunca vão
chegar a nascer incluem-se poetas maiores do que Keats e maiores cientistas do
que Newton. Sabemos isto porque o conjunto de pessoas potenciais pelo nosso ADN
é esmagadoramente superior ao conjunto de pessoas com existência efectiva. Não
obstante esta ínfima probabilidade, sou eu, somos nós, que na nossa vulgaridade
aqui estamos…
Como poderemos nós, então, os poucos privilegiados, que contra todas as probabilidades,
ganhámos a lotaria do nascimento, atrever-nos a queixar do nosso inevitável
regresso a esse estado anterior do qual a vasta maioria nunca despertou?”
(Richard
Dawkins em A Desilusão
de Deus)
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