sexta-feira, outubro 03, 2014

Olhos nos olhos
OLHOS NOS OLHOS…
























Por que se diz que os olhos são o espelho da alma? – 

Porque, para além de serem órgãos de visão, no caso particular da espécie humana, eles evoluíram para órgãos de comunicação que permitem aos seus pares perceberem, através deles, pensamentos e estados de alma.


Lembro bem, que quando era estudante, preferia as provas orais às escritas porque nestas faltavam-me os olhos dos professores para me orientarem na resposta.

Quando olhamos para uma pessoa, mesmo a uma distância razoável, graças ao contraste entre a esclerótica (o chamado branco do olho) e a íris, podemos ver com nitidez para onde os seus olhos estão a apontar, independentemente do sítio para onde o seu rosto está virado.

De mais perto, podemos ver se os olhos estão dilatados, graças ao contraste entre a íris e a pupila. Somos os únicos, entre os primatas, que possui janelas através das quais os outros podem olhar.

Os investigadores japoneses examinaram noventa e duas espécies de primatas e descobriram que somos a única na qual os contornos do olho e a posição da íris são claramente visíveis. Em todas as outras a esclerótica é pigmentada de modo a fornecer um contraste baixo. Além disso, em comparação com outros primatas, nos seres humanos, a porção do olho visível é desproporcionalmente grande e alongada no sentido horizontal.

Os gorilas, por exemplo, sendo muito maiores que nós a dimensão do olho exposto é mais pequena o que faz com que os seus olhos se pareçam a contas, ou seja: enquanto os olhos dos outros primatas evoluíram para serem “difíceis” de ver, para “ocultarem” e não “revelarem” informação sobre eles próprios - qualquer coisa que será o equivalente natural, hoje, aos óculos escuros de sol ou de janelas com as cortinas corridas – os dos humanos abriram-se à “leitura” pelos outros do que vai dentro deles.

Com aqueles adereços pretendemo-nos ocultar, esconder, ver sem sermos vistos, por outras palavras, favorecem a segregação e não o igualitarismo que permitiu aos pequenos grupos humanos de caçadores recoletores estabeleceram entre os seus membros a cooperação desviando-se da sociedade dos chimpanzés.

Assim que o igualitarismo estabilizou o suficiente nas primeiras comunidades dos nossos antepassados, logo a evolução genética começou a conferir novas formas às nossas mentes e aos nossos corpos de modo a funcionarem como jogadores de uma equipa em vez de entrarem em competição com membros do nosso próprio grupo.

Um cientista americano, Michael Tomasello, está na linha da frente no estudo e investigação dos olhos dos primatas. A sua base de estudo e centro de investigação encontra-se no Jardim Zoológico de Leipzig onde comunidades de chimpanzés, bonobos, gorilas e orangotangos, alojados separadamente em grandes instalações que recriam condições naturais, estão a ser observados e estudados podendo os estudiosos efectuar, paralelamente, investigação comportamental em crianças.

Mike desenvolveu aquilo que designa por “hipótese do olho cooperativo” para explicar como os nossos olhos se tornaram tão diferentes dos dos outros primatas.

Todos os símios estão profundamente cientes dos outros membros do seu grupo e atentos ao sítio para onde estão a olhar, com base na orientação da cabeça. Contudo, a sua utilização desta informação não é necessariamente cooperativa.

Numa sociedade onde os indivíduos dominantes fuzilam com os olhos os seus subordinados, que não se atrevem a devolver-lhes o olhar, a selecção natural favorece a ocultação da informação e já que a direcção da cabeça não pode ser ocultada, a direcção do olhar pode sê-lo minimizando a porção de olho exposta e o contraste entre a íris, a parte branca do olho e o resto do rosto.

Numa sociedade igualitária torna-se vantajoso para os membros da equipa partilhar informação, transformando os olhos, para além de órgãos de visão, em órgãos de comunicação.

A páginas 240 e seguintes do livro A Evolução Para Todos, de David Sloan Wilson, encontrará a descrição do resultado deste interessante estudo.

Entretanto, continuemos a olhar-mo-nos, cada vez mais, “olhos nos olhos”porque talvez a informação que transmitimos através deles seja mais genuína e verdadeira do que a outra, a da palavra.


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