Hoje, por dinheiro nenhum. |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 154
Levavam pressa, não podiam esperar que o fovoco chegasse ao fim: pelo jeito, ia se prolongar manhã adentro. Depressa, sinhas burras, toca a andar.
Ora, as putas, na influência dos
festejos, haviam decidido fechar o balaio, não aceitando fregueses nas noites
dos forrós junho: festa é festa. Estavam na intenção de divertir-se, dança
folgar, beber e rir, namorar, se fosse o caso.
Não sendo noite igual às outras todas - noites
de afanar-se, de suar em peito estranho, de representar gemendo sem sentir
vontade, gozando de mentira - as três recusaram em uníssono as ofertas do
apatacado boiadeiro e seus dois subordinados: hoje não, vancês desculpem, fica
pra outra vez.
Hoje, por dinheiro nenhum.
Misael escolhera Dalila, deixando
Bernarda para o velho,
Margarida para o rapaz. Vacilara entre
Bernarda e Dalila mas guardara na menina dos olhos a visão do fiofó da negra,
subilatório de assovio. O velho lambia os beiços, alvoroçado, o rapaz não
reclamou das sardas e do toco de braço da Cotó, defeitos de nascença: aos
dezoito anos se traça o que vem e se pede mais.
De nada adiantaram as explicações de
Dalila, boa de bico, nem o repelão de Margarida - logo quando Balbino, cafuzo
moderno e influído, começava a lhe arrastar a asa - tampouco a negativa rotunda de Bernarda: o
balaio tá fechado, avô. Nós abre rosnou o velho.
Os tangerinos estavam bastante altos e o
tempo era curto.
Arreda, disse Bernarda quando o velho
Totonho tentou arrastá-la para fora. Com o trompaço e o licor de jenipapo, o
atrevido vacilou nas pernas. Misael, que segurava Dalila pelo pulso, perdeu a
paciência, esbravejou:
-
Se ocês não quer ir por bem, vão por mal, sinhas putas!
A música silenciara para que Pedro
Cigano pudesse aliviar a sede com uma lapada de cachaça, a advertência ressoou
no
barracão;raparigas aproximaram-se,
curiosas; Misael, gostosão, rico e valente, pensou que vinham oferecidas
disputar o lugar das enjoadas:
-
Nós já escolheu essas, não precisa de ocês. - Voltou-se para as preferidas,
empurrou Dalila: - Vambora!
Epifânia deu um passo à frente, o suor
escorrendo sobre a pele negra; enfrentou os vaqueiros, a voz rouquenha,
lambuzada de licor:
-
Nem elas nem nós, nenhuma com vergonha nas fuças vai trepar hoje com vancês.
Não sabe que nós tá de balaio fechado?
Vão meter nas vacas, se qui ser. Para não perder o hábito e porque também ela
abusara do jenipapo de Cotinha, cuspiu no chão e passou o pé em cima.
Homem que se preza não leva para casa
desfeita de macho quanto mais de mulher-dama. Misael anunciou antes de agir:
- Essas três vão tomar no cu, queira ou
não queira, e tu vai apanhar na cara, joga de merda!
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