sexta-feira, janeiro 23, 2015

Hoje, por dinheiro nenhum.
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)



Episódio Nº 154

















Levavam pressa, não podiam esperar que o fovoco chegasse ao fim: pelo jeito, ia se prolongar manhã adentro. Depressa, sinhas burras, toca a andar.

Ora, as putas, na influência dos festejos, haviam decidido fechar o balaio, não aceitando fregueses nas noites dos forrós junho: festa é festa. Estavam na intenção de divertir-se, dança folgar, beber e rir, namorar, se fosse o caso.

 Não sendo noite igual às outras todas - noites de afanar-se, de suar em peito estranho, de representar gemendo sem sentir vontade, gozando de mentira - as três recusaram em uníssono as ofertas do apatacado boiadeiro e seus dois subordinados: hoje não, vancês desculpem, fica pra outra vez.

 Hoje, por dinheiro nenhum.

Misael escolhera Dalila, deixando Bernarda para o velho,
Margarida para o rapaz. Vacilara entre Bernarda e Dalila mas guardara na menina dos olhos a visão do fiofó da negra, subilatório de assovio. O velho lambia os beiços, alvoroçado, o rapaz não reclamou das sardas e do toco de braço da Cotó, defeitos de nascença: aos dezoito anos se traça o que vem e se pede mais.

De nada adiantaram as explicações de Dalila, boa de bico, nem o repelão de Margarida - logo quando Balbino, cafuzo moderno e influído, começava a lhe arrastar a asa -  tampouco a negativa rotunda de Bernarda: o balaio tá fechado, avô. Nós abre rosnou o velho.

Os tangerinos estavam bastante altos e o tempo era curto.
Arreda, disse Bernarda quando o velho Totonho tentou arrastá-la para fora. Com o trompaço e o licor de jenipapo, o atrevido vacilou nas pernas. Misael, que segurava Dalila pelo pulso, perdeu a paciência, esbravejou:

 - Se ocês não quer ir por bem, vão por mal, sinhas putas!

A música silenciara para que Pedro Cigano pudesse aliviar a sede com uma lapada de cachaça, a advertência ressoou no
barracão;raparigas aproximaram-se, curiosas; Misael, gostosão, rico e valente, pensou que vinham oferecidas disputar o lugar das enjoadas:

 - Nós já escolheu essas, não precisa de ocês. - Voltou-se para as preferidas, empurrou Dalila: - Vambora!

Epifânia deu um passo à frente, o suor escorrendo sobre a pele negra; enfrentou os vaqueiros, a voz rouquenha, lambuzada de licor:

 - Nem elas nem nós, nenhuma com vergonha nas fuças vai trepar hoje com vancês. Não sabe que nós tá de balaio fechado?

Vão meter nas vacas, se quiser. Para não perder o hábito e porque também ela abusara do jenipapo de Cotinha, cuspiu no chão e passou o pé em cima.

Homem que se preza não leva para casa desfeita de macho quanto mais de mulher-dama. Misael anunciou antes de agir:

- Essas três vão tomar no cu, queira ou não queira, e tu vai apanhar na cara, joga de merda!

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