sábado, fevereiro 21, 2015

Pouco depois da noite do temporal...
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)

Episódio Nº 180


















Antes de acompanhar o marido e a procissão de moradores em direcção ao morro, Zilda entregou a Coroca um par de chinelas cara-de-gato com pompom vermelho, prenda de luxo vinda de Ilhéus, e a Bernarda um pequeno embrulho contendo roupinhas de neném: camisola de pagão, sapatos de crochê, touca azul com fita branca, tudo feito por ela, jeitosa como não havia outra.

A barriga de Bernarda estufara. Vai ver são mabaças, brincou Zilda tocando o ventre da afilhada. Buchuda, pernas inchadas, não deu para Bernarda acompanhar a madrinha na escalada.

Manejando os facões, Lupiscínio e Balbino alargavam a trilha recém-aberta.

Natário não voltara ao cimo da colina desde que ali subira com Venturinha interessado nas minúcias do acontecido, havia anos. 

Pouco depois da noite de temporal, a noite da tocaia, da Tocaia Grande.


O POVOADO. A VELHA JACINTA COROCA SE INICIA
NO CONCEITUADO OFÍCIO DE PARTEIRA

1

- Quem te viu e quem te vê... Assunte no movimento, dona Coroca... Benza Deus! - O carpina Lupiscínio referia-se às mudanças ocorridas em Tocaia Grande.

Dirigiam-se ao descampado, ele e Jacinta Coroca. Aos domingos pela manhã os lavradores expunham em frente ao barracão de palha produtos da terra e animais de criação, trazidos na canoa cavada por Bastião da Rosa e por ele próprio, Lupiscínio, num tronco de vinhático que Ambrósio e os filhos haviam abatido a golpes de machado.

Naquele princípio do mundo os mestres de ofício, pedreiros ou carpinas, não enjeitavam encomenda, faziam de um tudo; todavia a partir do último inverno ninguém podia se queixar da falta de trabalho.

Sendo os ajustes de boca, maioria no fiado, acontecia com frequência o pagamento se atrasar, mas a palavra dada bastava como aval. No mais das vezes a tarefa contava com a ajuda colectiva: a troca de serviços era moeda corrente no lugar.

Na pisada dos sergipanos de Maroim, duas outras famílias haviam se estabelecido na margem oposta do rio, lavrando e plantando, criando galinhas, cabras e porcos. Devido à abundância de cobras venenosas, construíam as moradias sobre estacas, em baixo instalavam os chiqueiros.

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