Morada e tanto, sim senhor. |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 199
Parado em frente às portas do armazém, o
Coronel estudou os arredores. Do outro lado do rio cresciam os roçados a perder
de vista.
- Milharal mais bonito! Sergipanos?
Natário informou:
- A maioria. Mas também tem gente do
sertão.
- Outro dia chegou uma família, veio das
bandas de Buqui m.
- Contou o turco: - Seis pessoas.
- De Buqui m?
Eu sou de perto, sou de Estância: lugar bom pra se esperar a morte. Há quantos
anos não ia à cidade onde nascera e começara a trabalhar? Desde o falecimento
do pai, o velho José Andrade, cidadão que não levava desaforo para casa e tocava
trombone na Lira Estânciana:
- Gente de Estância é gente boa, ordeira e
trabalhadora. Não é como o povo mais do norte, da beira do São Francisco.
-
Provocava Natário, divertindo-se:
- Gente desordeira, cheia de lambança, não é, Natário?
O Capitão não se alterou com a
brincadeira, quase sorriu:
- A diferença, Coronel, é que em
Estância só tem pobreza.
No São Francisco pobreza é regalia, a
miséria campeia.
Um jumento zurrou perto do rio. O
Coronel, antes de atender ao convite de Fadul para entrar no armazém, deteve-se
a observar as casas novas, erguidas no Caminho dos Burros, umas quantas. Olhou
mais além do descampado a aglomeração de choupanas, um montão.
- E ali, o que é?
- A Baixa dos Sapos, o rancho das
raparigas. Antigamente eram cinco ou seis, agora não tem conta.
Demorou-se o Coronel a espiar o
movimento. Na porta do depósito do coronel Robustiano de Araújo uma tropa de
muitos burros descarregava cacau seco. No curral, homens de gibão de couro
cuidavam de uma boiada. Porcos, galinhas e perus espalhados pelas redondezas
fuçavam e ciscavam. Assustado bando de conquéns passou em disparada. Uma
velha atravessava o rio sobre as pedras.
- E tua casa, Natário? É aquela ali? — O
Coronel apontava para a casa de pedra e cal do negro Tição Abduim.
- Não, Coronel. A minha fica em cima
daquele morro. Dá pra ver daqui . A
não ser que vosmicê queira subir.
O Coronel elevou o olhar para a
construção recente, residência à altura do dono da Fazenda Boa Vista: dominava
o povoado.
- Precisa subir não. Vejo daqui . Morada e tanto, sim senhor.
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