Sentado no Martinho da Arcada |
Fernando Pessoa
Posso ter defeitos,
viver ansioso e ficar irritado algumas vezes,
mas não esqueço de que minha vida é a maior empresa do mundo.
mas não esqueço de que minha vida é a maior empresa do mundo.
E que posso evitar que ela vá a
falência.
Ser feliz é reconhecer que vale a
pena viver apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.
Ser feliz é deixar de ser vítima dos
problemas e
se tornar um autor da própria história.
se tornar um autor da própria história.
É atravessar desertos fora de si, mas
ser capaz de encontrar
um oásis no recôndito da sua alma.
um oásis no recôndito da sua alma.
É agradecer a Deus a cada manhã pelo
milagre da vida.
Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.
Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.
É saber falar de si mesmo.
É ter coragem para ouvir um 'não'.
É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.
Pedras no caminho?
É ter coragem para ouvir um 'não'.
É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.
Pedras no caminho?
Guardo todas, um dia vou construir um
castelo...
(Fernando Pessoa)
P.S.
- A profundidade do pensamento deste homem é desconcertante. Não é poesia, não
é prosa, está para lá de tudo isso.
Quando
fui a Lisboa, há tempos, para os almoços mensais com os meus colegas, sentei-me
numa mesa de café, no Martinho da Arcada que ele frequentava, exactamente por
baixo das arcadas do Terreiro do Paço, a caminho da Baixa, e gostei de pensar
que ali, naquele mesmo sítio, havia um génio, fraca figura de gente, que também
se sentava a uma daquelas mesas e produzia textos como aquele que acima reproduzo, quem sabe senão
mesmo aquele, que não são verso nem prosa que estão para além da prosa e da
poesia para se situarem no campo do pensamento puro.
Aquele
homem, ao que se sabe da sua vida, simples guarda-livros de profissão, com
Ofélia, eterna namorada, que não passou do 1º ano de um curso superior de
Letras, empresário falido de uma pequena tipografia, tinha algum motivo
especial para ser feliz, daqueles motivos que costumam fazer a felicidade das
pessoas?...
E
no entanto carregava dentro de si um mundo inesgotável de riqueza que abarcava
toda a humanidade: um pensamento, uma intelectualidade que nos fazem sentir
pequeninos ao pé dele.
Será
que ele tinha verdadeira consciência do que era e de quem era, do seu valor, em
suma, vivendo num país que o escondia e ocultava deixando-o morrer numa mísera
cama de um hospital levando consigo Ricardo Reis, Álvaro Campos e Alberto
Caeiro, seus heterónimos, com uma chapa, um número e um diagnóstico apressado
de cirrose hepática que afinal não passaria de uma inflamação aguda do
pâncreas, aos 47 anos de vida?
O regime de Salazar, talvez suspeitando do seu
valor, preferiu despachá-lo como bêbado não lhe perdoando o facto de sendo ele,
de início, apoiante de uma ditadura que restabelecesse a paz na vida social
portuguesa que vivia numa latente guerra civil - ficou célebre a frase de que “hoje, por ser Domingo,
não houve revolução em Portugal” - em 1933 admitia já que o novo regime de
Salazar não era a solução para o país que ele desejara em 1926 e que Salazar eternizou para se manter no poder.
De
herança deixou para além da obra publicada, quatro livros, três deles em língua
inglesa, a sua primeira língua que dominou melhor que a portuguesa no início da sua vida por ter nascido e vivido na África do Sul onde estudou num Colégio Inglês, e um livro em português, O Livro
do Desassossego, o seu melhor, e uma arca com 25.000 papéis lá dentro.
Repousa,
desde 1988, no Mosteiro dos Jerónimos para vergonha de quantos em vida o
ignoraram a ele que foi considerado o mais universal poeta, filósofo e escritor
português, o expoente máximo da nossa língua ainda que na hora da morte, na
cama do hospital, tenha preferido a língua inglesa para escrever as suas ultimas frases.
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
Fernando Pessoa
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