(Domingos Amaral)
Episódio Nº 6
A hostilidade entre os dois
grupos de muçulmanos era evidente. Taxfin, tal como Zulmira e Abu Zhakaria, era
um cordovês, um árabe da Andaluzia, enquanto Ali Yusuf e os seus berberes eram
uns brutamontes dos desertos africanos, sanguinário e primitivos.
Aquela era uma aliança
forçada e desagradável, embora necessária.
Para vencer os cristãos, os
andaluzes precisavam dos berberes e da sua energia bélica. Os governadores das
taifas, os walis de Córdova, Sevilha ou Badajoz, apesar de contrariados,
aceitavam o jugo de Ali Yusuf, o califa de Marraquexe, mesmo que fosse apenas
temporariamente.
Por essa razão, Taxfin tinha
decidido vir em conjunto até Coimbra tomar a cidade cristã que resistia há
tantos anos, e tentar matar os descendentes do Imperador Afonso VI, Dª Teresa e
seu filho Afonso Henriques.
Ali Yusuf era apenas um
“wali”, e precisava ainda do califa, pois não tinha assim tantos homens, só em
Córdova a sua palavra e ordens eram aceites.
Talvez por isso, o azedume
dos andaluzes contra os berberes tornara a empresa numa tormenta. Havia
quezílias permanentes e as escaramuças só se suspenderam quando chegaram aos
arrabaldes de Coimbra e atacaram os cristãos das redondezas.
O intervalo pacífico durou
pouco tempo: o califa tinha dúvidas sobre o ataque à cidade e mais nervoso
ficou quando Taxfin voltou triunfante de Soure, dizendo que a povoação fora
arrasada.
Cuidado, meu marido, Ali
Yusuf é ciumento – murmurava Zulmira.
Tinha razão: vinte e cinco
dias depois de cercarem Coimbra, Yusuf começou a dar sinais contraditórios.
Falava em combates em Saragoça, em Valência, em Toledo, e Taxfin regressara à
tenda da família, sempre acompanhado de Abu Zhakaria, a vociferar que o califa
era um cobarde e um tolo!
- Devíamos matá-lo aqui às portas de Coimbra! Pendurar a cabeça do
estúpido berbere nas muralhas cristãs, antes de tomar a cidade!
Zaida, de cinco anos apenas,
olhou-o pálida, enquanto Zulmira o repreendia levemente:
- Esposo, não fales assim,
assustais minhas filhas.
Taxfin sorriu às meninas,
colocou mais uma vez o dedo à frente da boca e nessa noite adormeceu a contar
histórias da serra Morena, do castelo de Hisn Abi Cherif para onde a família se
retirava no verão, e onde duas criadas os brindavam com seus suculentos
escabeches e os seus saborosos ensopados.
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