(Jorge Amado)
Episódio Nº
273
11
Ao ouvir o estampido, Coroca precipitara-se
para casa, entrou gritando por Bernarda. Não esperou que ela despachasse o freguês,
arrebanhou o menino e partiu correndo, espadanando água, curvada pelo vento. Ao
sair, avisou:
- Tou indo pra casa do Capitão, levando
Nadinho. Ande depressa.
Bernarda a alcançou no começo dos
degraus de pedra, arfante:
- Que chuva é essa, comadre? Nunca vi...
Coroca restituiu-lhe a criança:
- Se fosse só chuva... É a enchente, tu
não se deu conta?
- Tava ocupada. Pra onde vosmicê vai?
Coroca dera meia-volta, Bernarda
segurou-lhe o braço: a lama corria entre as pernas das duas mulheres, o vento
as sacudia:
- Zeferina pariu inda agorinha, vou lá
ver ela e a menina que nasceu. Ajudar no que puder.
No sopé da colina vultos se agitavam.
Não passou pela cabeça de Bernarda deter a velha, ao contrário soltou-lhe o
braço, aconchegou o menino contra o peito e, antes de retomar a subida, avisou:
- Deixo Nadinho com madrinha Zilda e vou
lhe encontrar.
- É melhor tu ficar por aqui . Vai ter muito que acudir.
- Possa ser.
Coroca desceu equi librando-se
nos degraus escorregadios,
Bernarda prosseguiu na subida, Edu veio
a seu encontro:
- Quer que ajude? Me dê o menino. Mãe tá
lhe esperando.
-
Precisa não. E tu? Tá indo onde?
-
Vou pegar um burro pro mode ir avisar Pai que tá na Atalaia sem saber de nada.
Ouviram
o barulho do palheiro desabando. Parados, tentaram enxergar na escuridão, o
vento cortava como navalha.
Edu
despencou pela ladeira.
-
Corre pressa!
Bernarda
retomou a subida; o menino choramingava. Da varanda destacou-se o vulto de
Zilda, andou rapidamente para Bernarda, estendeu os braços para recolher a
criança:
-
Me dá meu filho.
Somente
então, ao abrigar-se em casa dos padrinhos, Bernarda estremeceu de medo: não dos
perigos da enchente, não era medo de morrer. Muito pior: teve medo da bondade,
das abnegações da vida.
Bem
Coroca lhe avisara: quando mulher-dama bota menino no mundo, um dos dois se prepare
para sofrer. Ou o filho na desvergonha e no descaso dos puteiros ou a mãe
partida ao meio, o coração fora do peito.
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