quinta-feira, julho 23, 2015

Aos quarenta uma catraia boa para os urubus.
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)

Episódio Nº 291





















Antes da enchente, além do Caminho dos Burros, artéria única acompanhando o rio, havia o descampado com o terreiro ao centro e, espalhados na distância, o armazém, a oficina do ferrador de burros, o depósito de cacau e o curral, pouso das boiadas.

Mais adiante, a Baixa dos Sapos, com as choças de palha e a casinhota de madeira onde viviam Bernarda e Coroca. Assim era Tocaia Grande: em paragem tão bonita um lugarejo feio.

Até a lembrança se perdeu nas águas.

O Caminho dos Burros passara a ser Rua da Frente, de alegres fachadas coloridas. Paralela à Rua dos Fundos: houve quem preferisse habitar mais distante do rio.

No Beco do Meio que ligava as duas vielas - as duas ruas na ostentação do povo - os tamanqueiros viviam e trabalhavam.

Ali também dona Natalina colocara a máquina de costura e não chegava para as encomendas. Uma delas, recentíssima, trazida pelo capitão Natário da Fonseca: vestido de festa para Sacramento, a zinha que embeiçara o coronel Boaventura.

Na Baixa dos Sapos novas palhoças substituíram as que o rio levara, todas aliás. As raparigas precisavam com urgência de um buraco onde estender ás esteiras. Outras, porém, menos apressadas, tendo fixado raízes em Tocaia Grande - Nininha, xodó de Lupiscínio, para lembrar apenas uma -  aproveitavam para construir habitações estáveis.

Assim, uma ruela de barracos de adobe nasceu e prosperou: na esquina, pintada de amarelo, ficava a pensão de Nora Pão-de-Ló: alcunha precisa aos quinze anos, quando debutara em Aracaju, fofo e saboroso pão-de-ló; aos quarenta uma catraia boa para os urubus.

Pensão de Nora e não de Ressu. Ressu, coitada, incapaz de administrar a própria xoxota, passara a idéia a Nora pelo mesmo preço que a recebera do Capitão: de graça.

Vale a pena uma referência a fato curioso, demonstrativo da ânsia de construção que dominara o arraial: donos de barracos que haviam resistido à cheia terminaram por derrubá-los para edificar outros mais confortáveis.

 A olaria não dava abasto aos pedidos de telhas e tijolos. Zé Luiz e Merência se não ficaram ricos ao menos tornaram-se credores da maioria dos habitantes.

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