sábado, julho 11, 2015

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)

Episódio Nº 13














A verdadeira mãe de Afonso Henriques foi sempre a minha mãe, Dórdia Viegas. Ela mimava-o, penteava-o, vestia-o, à noite levava-o para a cama e fazia-lhe o sinal da cruz na testa, como a mim, ao Afonso ou ao Soeiro. Tratava-o como nos tratava a nós os três, seus filhos. Com ternura, como uma mãe deve.

E ele retribuía. Amava-a como nós a amávamos, sempre de roda dela a pedir coisas, a reclamar atenção.

Uma vez o Afonso Henriques disse-me:

 - Deus é injusto. O meu pai morreu, tinha eu três anos, não o conheci, só às suas barbas cinzentas e falantes. E Dórdia, a minha única mãe, morreu naquele dia do cerco a Coimbra!

Para minha grande tristeza e de toda a família dos Moniz de Ribadouro, Dórdia Viegas já arfava muito, tinha de sentar-se constantemente, e à mesa estava sempre com um ar calmo de mais, como quem tinha muitas dores mas sofria em silêncio, para não incomodar os outros.

Tanto o meu amigo como eu que, se ela subisse ao céu, ninguém mais nos iria dizer:

 - Vinde dar-me um beijo!

Isso entristecia-o muito, dizia-me o meu melhor amigo, e era por isso que fazia um esforço para imaginar combates sangrentos logo de manhã no alto do castelo de Coimbra.

Enquanto o arqueiro suspende a ronda, a um canto da torre, o menino mira de novo a faustosa do califa, e promete a si próprio que quando for grande o vai derrotar.

Terá de aprender a usar a enorme espada de seu pai, a montar, a vestir a cota de malha e a armadura, mas será o mais hábil, corajoso e destemido cavaleiro do condado de Portucalense.

Agora sente-se forte, imaginar vitórias animou-o, mas logo se lembra do que ouviu Egas ou Ermígio dizerem, que sem Paio Soares a comandá-las as tropas de Dona Tereza pouco valem, pois Bermudo de Trava, seu marido, não nasceu para empunhar a espada!

Ontem, escutou também as meninas árabes a intrigarem, aos risinhos, nas suas costas:

- A rainha não gosta do Bermudo, gosta é do irmão, do Fernão!

O menino também já reparou que Dona Tereza também nunca beija o marido em público, eles nem se tocam, não há uma festa carinhosa, uma ternura visível. Nunca viu sequer um abraço e sempre atribuiu essa falha à maneira de ser de Dona Tereza.


Dórdia diz que ela é arisca, quando falam na condessa que agora se diz rainha, o que é raro, pois Dórdia evita falar dela.

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