Vou tomar ele pra criar. |
TOCAIA
GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio
Nº 285
Cercaram-no de todos os lados. Zilda carregava ao colo o filho de Bernarda:
-
Vou tomar ele pra criar.
O
Capitão assentiu com a cabeça; pintando o sete, reinavam
pela
casa meninas e meninos que Zilda parira ou adotara, todos com a mesma cara de
curiboca, sangue forte de índio: a bênção, meu pai.
22
Colocados em redes, iluminados pelas
tochas, os corpos foram levados diretamente ao cemitério ao escurecer. Não
havia local em condições para compassiva e influída sentinela na qual, entre
tragos de cachaça, recordassem as boas qualidades dos falecidos.
Ção, bonita e simples do juízo, fora a
alegria do arraial, quem não a estimava?
Os moleques corriam atrás dela, em algazarra. Os
rapazes derribavam-na no emborco da canoa, nos cerrados em macios leitos de
capim, nas clareiras da mata na vista dos lagartos impassíveis.
Não somente rapazes novos, também homens
feitos e maduros a desfrutarem e eram esses os que ela preferia. Teria sido compassivo
e indiscreto velório de fuxicaria, fecundo em indagações: quem sabe, na fiada
de lembranças e inconfidências, se tirasse a limpo o segredo em que se mantinha
envolto o descabaçamento de Ção.
Quem lhe comera os tampos, enfrentando a
ira de Deus? Que não fora nenhum dos três insistentes e inept os gabirus, Aurélio, Zinho e Durvalino, se sabia
com certeza. Quem então?
Pedro Cigano, sanfoneiro? Dodô Peroba que
amansava passarinhos?
Guido? Balbino? Seu Cícero Moura, de
colarinho duro e gravata-borboleta?
Seu Cícero Moura, não. Somente se
aproveitou e se regalou depois dela ter perdido os tampos. Havia muito também o
que contar sobre seu Cícero: começando pelas razões do apelido de Doutor Permanganato,
as manias de limpeza, o gosto pelas mucamas, o odor de brilhantina, a risca no
cabelo.
Pessoa importante nos atalhados do rio das
Cobras, comprador de cacau, comissário de firma exportadora. Quem o
substituísse, de fazenda em fazenda, carregando a pasta de documentos e o livro
de notas, continuaria, ou não, a ofertar as pequenas estampas de santo, prenda
piedosa e cobiçada?
Quem quer que fosse, não haveria de ser
tão engomado e divertido quanto seu Cícero Moura.
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