quinta-feira, julho 16, 2015

Vou tomar ele pra criar.
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)


Episódio Nº 285



















Cercaram-no de todos os lados. Zilda carregava ao colo o filho de Bernarda:

- Vou tomar ele pra criar.

O Capitão assentiu com a cabeça; pintando o sete, reinavam
pela casa meninas e meninos que Zilda parira ou adotara, todos com a mesma cara de curiboca, sangue forte de índio: a bênção, meu pai.

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Colocados em redes, iluminados pelas tochas, os corpos foram levados diretamente ao cemitério ao escurecer. Não havia local em condições para compassiva e influída sentinela na qual, entre tragos de cachaça, recordassem as boas qualidades dos falecidos.

Ção, bonita e simples do juízo, fora a alegria do arraial, quem não a estimava?

Os moleques corriam atrás dela, em algazarra. Os rapazes derribavam-na no emborco da canoa, nos cerrados em macios leitos de capim, nas clareiras da mata na vista dos lagartos impassíveis.

Não somente rapazes novos, também homens feitos e maduros a desfrutarem e eram esses os que ela preferia. Teria sido compassivo e indiscreto velório de fuxicaria, fecundo em indagações: quem sabe, na fiada de lembranças e inconfidências, se tirasse a limpo o segredo em que se mantinha envolto o descabaçamento de Ção.

Quem lhe comera os tampos, enfrentando a ira de Deus? Que não fora nenhum dos três insistentes e ineptos gabirus, Aurélio, Zinho e Durvalino, se sabia com certeza. Quem então?

Pedro Cigano, sanfoneiro? Dodô Peroba que amansava passarinhos?

Guido? Balbino? Seu Cícero Moura, de colarinho duro e gravata-borboleta?

Seu Cícero Moura, não. Somente se aproveitou e se regalou depois dela ter perdido os tampos. Havia muito também o que contar sobre seu Cícero: começando pelas razões do apelido de Doutor Permanganato, as manias de limpeza, o gosto pelas mucamas, o odor de brilhantina, a risca no cabelo.

Pessoa importante nos atalhados do rio das Cobras, comprador de cacau, comissário de firma exportadora. Quem o substituísse, de fazenda em fazenda, carregando a pasta de documentos e o livro de notas, continuaria, ou não, a ofertar as pequenas estampas de santo, prenda piedosa e cobiçada?

Quem quer que fosse, não haveria de ser tão engomado e divertido quanto seu Cícero Moura.

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