sexta-feira, setembro 04, 2015

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)




Episódio Nº 50

















Fátima apontou o dedo para um curral nas traseiras dos edifícios, onde eram visíveis vários suínos a chafurdarem na lama.

. Estava a falar daqueles.

Veloz de espírito, Raimunda retorquiu-lhe:

- Os porcos deram tal susto ao vosso califa que ele se borrou de medo e há nove anos que não volta.

Fátima preparava-se para disparar nova salva de crueldades, quando Zulmira se intrometeu, evitando o azedar da polémica.

- E vós, não ides à missa? É Sexta-Feira Santa.

Raimunda enfrentou a distinta muçulmana com uma ponta de hostilidade, responsabilizando-a pelo desbragamento da filha.

- Tendes de pôr pimenta na língua da Fátima!



Nove anos depois da bulha infantil com Afonso Henriques, a mais velha das meninas mouras continuava uma fera bravia e indomável.

Contava-se que certa vez tentara convencer o moçárabe de Coimbra a organizar uma fuga, levando-a dali com a mãe e a irmã, provavelmente com destino a Córdova.

A partir de então todos andavam de olho nela e rapidamente denunciavam qualquer engenhoso plano que elaborasse para se escapulir.

Frustrada, a jovem moura vingava-se com ditos excessivos e cruéis, com os quais fustigava os cristãos.

Embora por vezes temesse as imprevisíveis consequências da linguagem da filha, recordo-me bem do orgulho que Zulmira tinha nela, tão esperta e combativa.

Além disso, e ao pé da minha prima Raimunda que era só pele e ossos, Fátima destacava-se, exuberante e vistosa.

Os longos cabelos negros, sempre desalinhados, o nariz fino e espetado, as sobrancelhas escuras e suaves, o queixo pontiagudo e uns olhos escuros, que pareciam azeitonas de Andaluzia a brilharem ao sol depois de colhidas, não faziam de Fátima uma mulher demasiado bela, como a irmã Zaida era, mas mesmo assim fascinava os machos com a forma como mexia as ancas, a maneira como se empertigava, espetando os pequenos seios para a frente, para que reparassem neles.

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