Bendito louvado seja o Menino Deus nascido |
Tocaia Grande
(Jorge Amado)
Episódio Nº 327
Na sala de visitas não havia espaço suficiente
para a movimentação do terno: as reinações do Boi, as evoluções da Senhorita Dona
Deusa e do Caboclo Gostosinho, as cambalhotas do palhaço Mateus, o corre-corre
da Besta-Fera, a entrada dos soldados: vale dizer jagunços.
Nem na casa do Capitão, menos ainda nas
demais visitadas a seguir. Em todas elas o reisado apresentou uma única
jornada, além da pedição da sala, os benditos cantados em honra do menino-Deus:
Bendito louvado seja
Bendito louvado seja
O menino-Deus nascido
Primeiro dançaram juntos os dois cordões,
depois separados o encarnado e o azul, iniciando a competição do estandarte e a
divisão da assistência em dois partidos.
Passaram então à exibição individual das
pastoras, uma a uma no centro da sala e, sem querer desfazer de nenhuma delas,
pois todas eram lindas e airosas, inclusive sia Vanjé, corta-jaca de primeira,
a verdade manda dizer que Bernarda sobressaiu entre as demais.
Após arrancar aplausos rodopiando, no repinique
da orquestra, segurando a haste de bambu com a lanterna de papel de seda
transparente, a formosa pastora Ciganinha com a outra mão trouxe para a roda
uma criança de seus dois anos de idade, se tivesse mais, pouco seria: filho de
criação de Zilda, nascido do ventre de Bernarda.
Dançaram, mãe e filho, inovações do reisado
em terras de
Tocaia Grande.
A harmónica e os cavaqui nhos puxavam a melodia pobre; o bombo, novo em
folha, fazia a marcação. Vestidos de chitão florado e colorido, com rendas,
laços e babados, os chapéus de palha ornamentados com folhas e flores de pano,
enfeitados com fitas azuis e cor-de-rosa - o azul da Virgem Imaculada, o
encarnado da Paixão de Cristo, - as
pastoras de Tocaia Grande dançaram e cantaram para o menino-Deus nascido no
presépio de Belém e, sabe-se lá por que, achado em Roma:
O menino-Deus nascido
Foi achado lá em Roma
Foi achado lá em Roma
Vestidinho num altar
Terminados os benditos, houve uma pausa na
função para o
beberete, comezaina farta e gostosa. As
garrafas de cachaça passando de mão em mão, bebiam pelo gargalo: os copos e cálices
reservados para o licor de jenipapo servido às pastoras.
Limpando a boca com as costas da mão, os
figurantes do reisado iniciaram o Canto de Despedida, iam folgar em outra casa:
Oi boa tarde
Senhoras, Senhoritas
A minha ida
Vai fazer vocês chorar
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