Como eu ia dizer não se só pensava em Vosmicê? |
Tocaia Grande
(Jorge Amado)
Episódio Nº 344
- Um sorriso entre as lágrimas, examinou
os braços poeirentos do caminho, tocou os cabelos duros de sujeira, falou baixinho:
- Tou precisando de tomar um banho, tou
horrorosa. Assim Mãe apareça, vou me lavar no rio.
Natário lhe disse onde Efigênia estava e o
que fazia. Entre encabulada e atrevida, Sacramento anunciou:
- Entonces vou me banhar agora mesmo,
antes dela chegar.
Tou imunda, tão feia que vosmicê nem
repara em mim.
- Suja ou limpa, tu é bonita como quê. Se
o Coronel não tivesse posto o olho em tu, quem ia lhe fazer mulher havia de ser
eu.
- Possa ser. Como eu ia dizer não, se eu
só pensava em Vosmicê?
Andou para a porta, passou junto a ele, os
seios túrgidos tocaram o peito do Capitão. Com sua licença, Coronel: ele a
seguiu no rumo do ribeirão.
8
Fuad Karan, na mesa do bar, saboreando o
arak perfumado,
bebida predileta, sorriu para o Grão-Turco,
o amigo Fadul Abdala, e declarou, enfático:
- Desabou sobre Itabuna, meu Fadul, um
cataclisma sexual e vivemos sob seu signo. Atende pela poética e misteriosa
invocação de Ludmila Gregorióvna Cytkynbaum, um verso, vês?
- Repetiu
elevando, num gesto declamatório, a mão aberta e a voz empostada e redonda: - Veio
das taigas siberianas: Ludmila Gregorióvna Cytkynbaum!
Durante um segundo deteve-se a ouvir o eco
da límpida pronúncia do nome altissonante, num evidente aplauso à própria voz:
- Já ouviste falar em mulher fatal, meu
Fadul? Ludmila Gregorióvna é o espécime perfeito, é o protótipo, o paradigma da
mulher fatal, e estamos todos acorrentados aos seus encantos, somos seus
escravos, felizes em nossa escravidão.
Fuad Karan sorveu um gole de arak para
temperar a garganta. O rosto irradiando profundo gozo intelectual, Fadul o
acompanhou.
Embevecido, escutava o boa-vida, um de
seus dois corifeus: o outro era Álvaro Faria e habitava em Ilhéus.
- Uma devoradora de homens, meu
Grão-Turco. Escuros de preferência, quanto mais afro, mais lhe toca a psique e
lhe humedece a vulva.
Pertence de direito mas não de fato ao
nosso novo mestre e senhor, o doutor Boaventura Andrade Júnior, herdeiro do
Reino Unido de Itabuna e Ilhéus.
Estamos no reinado de Boaventura II, o
Alegre, sucessor de Boaventura I, o Pai-D’Égua.
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