O sujeitinho não valia o cartucho que gastei |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 338
Como pudera dona Ernestina suportar o
acontecido sem cair morta ali também, no mesmo instante, ao lado do marido?
Com um grito atirou-se sobre o corpo
inerte, e quando Sacramento conseguiu levantá-la, abraçou-se com a moça, juntas
choraram.
O marido morto, o filho longe, sozinha e
perdida, dona Ernestina encontrou amparo e consolo na devotada e incansável Sacramento.
Levou-a consigo no trem especial em que,
na manhã seguinte, embarcaram o corpo do falecido para enterrá-lo em Ilhéus.
Chegado às pressas, no meio da noite,
Natário se encarregara de tomar as providências. O rosto imóvel não deixava
transparecer o que sentia, trancado num silêncio duro e opaco.
A
partir de então até o desembarque de Venturinha, Sacramento fez companhia a
dona Ernestina e chorou com ela a morte do coronel Boaventura Andrade,
fazendeiro de cacau,
milionário,
chefe de jagunços, senhor das sesmarias da Atalaia, mandachuva em Ilhéus e em
Itabuna.
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Se, como era voz corrente e ele próprio,
coronel Robustiano de Araújo, pudera constatar, o trato dado às roças da
Fazenda da Atalaia fosse idêntico ao dispensado por Natário aos cacauais da Boa
Vista, tinha Venturinha razão em demasia ao se aborrecer com a recusa do
administrador a se manter no posto.
Inabalável recusa, não houve proposta de
dinheiro, vantagens outras e diversas capazes de modificar a decisão de
Natário.
Por que razão? - Perguntou o coronel
Robustiano de Araújo, a curiosidade se manifestando entre os louvores ao viço
das roças e à floração paradisíaca: nada mais próximo à beleza do Paraíso do
que a comovente imagem de uma plantação de cacau carregada de flores e de
bilros.
O capitão Natário da Fonseca ouviu a
indagação sem mover um único músculo do rosto de curiboca: a face cobreada, os
olhos miúdos, nos lábios aquele fio de sorriso que o bacharel e poeta Medauar
um dia comparara a um fino corte de navalha.
Sorriso enigmático, uns pensavam-no
zombeteiro, outros achavam-no amedrontador.
- Vou lhe dizer, Coronel, se tiver
paciência pra me ouvir. Vim de Sergipe, era um menino, tinha feito uma
estrepolia por lá.
Coisa de somenos, o sujeitinho não valia o
cartucho que gastei.
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