segunda-feira, janeiro 04, 2016

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)

Episódio Nº 145



















Um popular perguntou se a podia arrombar, mas quando ia lançar-se contra a porta esta abriu-se finalmente.

O frenesim amainou e um nobre, talvez com sessenta anos, com uma cara amargurada, saiu para o alpendre e perguntou, a medo, o que queriam.

Raimunda exclamou:

 - A desavergonhada!

O homem, aflito, levou as mãos à cabeça:

 - Mas porquê, que fez minha filha?

Raimunda ignorou-o e gritou: ~

- Ela que saia depressa, ou iremos buscá-la!

Nisto, apareceu um vulto no interior da casa, com um véu na cabeça, e um murmúrio impressionado percorreu a multidão.

 - Segui-me até à Igreja, berrou Raimunda.

Temendo ser fustigada pela fúria dos populares, ou alvo de cuspo de velhas afoitas e desdenhosas, a mulher avançou agarrada ao braço do pai.

A custo, abriu-se um espaço no meio dos locais, que os comiam com os olhos, enquanto Raimunda ordenava:

 - Abri alas, gente de Lamego, deixai-nos passar!

O estranho cortejo avançou pelas ruas até chegar ao pátio da Igreja, à porta da qual se encontrava uma segunda mulher, também de véu a cobri-lhe a cabeça.

A seu lado estava seu pai a guardá-la.

Quando as duas comitivas se juntaram, Raimunda gritou às duas mulheres:

 - Estais preparadas para...?

Suspendeu as palavras de cara cruel e espada na mão, enquanto o silêncio nascia no pátio. Satisfeita, Raimunda acrescentou:

- ... Casar?

Soltou-se um grito de alegria na multidão e ouviram-se exclamações de satisfação. Estava cumprido o costume antigo que mandava as noivas serem arrancadas à força de suas casas, numa simulação de um rapto, e depois levadas pelas ruas, cercadas pelo povo como se fossem para o cadafalso, antes de serem entregues aos futuros maridos, à porta da Igreja.

A primeira noiva que Raimunda fora buscar era a minha Maria Gomes. A segunda era Teresa Celanova. Nas escadas esperavam os respectivos noivos, meu pai, Egas Moniz, e eu, bem como o prior de Viseu, Teotónio, que ali se deslocara de Propósito.

Atrás de nós vinham os meus irmãos, Afonso Henriques, Gonçalo, o meu tio Ermígio Moniz, e também a bela Chamoa Gomes e seus pais.


A minha cunhada estava grávida de três meses, como já se notava na dalmática rosa e no busto mais cheio mas, para aflição de Raimunda, parecia ainda mais bonita.

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