quinta-feira, janeiro 28, 2016

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)

Episódio Nº 165




















A dado momento, viu luz à sua frente e parou. Ordenou que elas ficassem quietas e em silêncio, deixou-lhes a vela e avançou sozinho.

Trinta metros à frente, o túnel terminava numa gruta, e Mem viu uma pequena fogueira, junto da qual estava sentada uma mulher vestida de negro, que imediatamente reconheceu.

_ Entra Mem e dizei-lhes que podem vir também – disse ela.

O almocreve não se surpreendeu, aquela mulher sabia sempre tudo.

Chamou as mouras, mas quando elas entraram na gruta a bruxa tapou mais a cara com o capuz. Ao ver Zulmira murmurou uma justificação:

 - Sois tão belas que me envergonho.

As outras nada disseram apenas se sentaram à volta da fogueira, sem lhe conseguirem ver o rosto.

- Sei quem vós sois – afirmou a mulher. Os cristãos virão procurar-vos, e Soure está cheia de cavaleiros, não vai ser fácil passardes por lá.

Mem contou-lhe o que queria, e ela suspirou, pensativa. Depois, disse:

 - Há uma atalaia aqui perto. Posso enviar um dos meus corvos com uma mensagem. Conheço gente em Santarém.

Mexeu no fogo, ateando a fogueira um pouco mais.

Abu Zakaria, virá pela floresta, e teremos de voltar por lá, caso contrário sereis apanhadas.

Ouviu-se uma coruja piar, algures nos túneis e a velha vestida de negro pareceu preocupada. Levantou-se e observou o fogo.

Vejo muitos mortos – murmurou.

Enquanto Zaida se encolhia junto à mãe, a mulher de negro deu uns passos até ao canto da gruta, onde pegou num cantil e num pote que trouxe para junto deles.

Colocou o pote em cima da fogueira e deitou lá para dentro umas pequenas pedras misturando-as com ervas. Depois, ofereceu a Mem o seu cantil e informou:

 - É hidromel. Elas devem beber também, para dormirem melhor.

Agarrou no cajado e avançou na direcção de um túnel, diferente daquele por onde tinham chegado Mem e as três mulheres. Sem se virar para trás declarou antes de desaparecer:

 - Não saiam daqui.

Mal ela partiu o almocreve contou às mouras onde conhecera aquela mulher e o que havia combinado com Abu Zhakaria para Agosto.

Zulmira e Zaida estavam embevecidas, admirando-o e Fátima ficou num total êxtase, a pontos de recusar comer e beber. Afastou-se para o fundo da gruta e adormeceu rapidamente,

Junto à fogueira Zaida e a mãe recordaram a descoberta terrível de Dona Teresa, que reconhecera Zulmira.

A gruta estava com um cheiro intenso devido às ervas do pote e Mem sentiu-se confortável pela primeira vez em muitas horas. Serviu mais hidromel e olhou para Zulmira:

- Sois neta do antigo rei de Sevilha, Al-Mutamid; a vossa mãe teve um filho de Afonso VI; haveis fugido de Toledo; casado com o pai de Zaida e de Fátima; e depois dele morrer com Taxfin.

Que vida...

Zulmira, sorriu-lhe e, sempre curioso, o almocreve,  perguntou.

- E porque quer o assassin matar-vos a mando do califa?

Zaida bebeu também um gole de hidromel e largou uma rizada.

É melhor do que vinho! – exclamou.

Zulmira riu também, antes de se indignar:

 - O califa berbere é um canalha! Mata quem lhe faz sombra. Matou o Taxfin e quer-nos mortas também!

Faltava a explicação para a sombra que elas faziam ao califa, e mem insistiu, mas Zulmira apenas exclamou:

- Os almorávidas são berberes dos desertos, não são árabes da Andaluzia, como nós! Odeiam-nos!

Dando um apressado gole no hidromel, fez um esgar de desprezo.

- São fanáticos! Nós somos diferentes, somos de Córdova! Foi uma grande cidade, no tempo dos antigos califas, antes dos almorávidas chegarem.


Em His Abi Cherif, fomos dos poucos que mantivemos essas tradições, da poesia, da filosofia, da história e do amor! Somos diferentes, de um Islão mais bonito.

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