O que quiserem, com prazer. |
Tieta
do Agreste
(Jorge Amado)
Vou acreditar
em tudo o que você me disser, paixão, se me arranjar alguma coisa para beber… -
a voz do ser fêmea desmaia em promessas.
Da mesa, Osnar constata:
- Estão vindo para cá Almirante. Me segure pois sou capaz de perder o
juízo e agarrar essa visão aqui
mesmo. Sempre tive vontade de comer uma marciana na falta de uma polaca, pois
igual a uma polaca não existe em nenhum planeta.
– A célebre história da polaca
de Osnar.
O grupo aproxima-se, boas tardes de lado a lado, tomam mesa. Manuel
atende, solícito, enquanto Osnar não desgruda os olhos do ser fêmea que, à
falta de água de coco – não pode faltar coco mole no bar, anota Ascânio –
aceita guaraná.
- Para mim whisky on the rocks… pede o ser provavelmente macho.
- Scotch, naturalmente… Quero dizer, escocês.
- Só tenho nacional mas é do legítimo – orgulha-se seu Manuel.
Não, por favor não! Traga-me então, uma mineral sem gás. Bem gelada.
A água daqui é melhor do que
qualquer mineral, já foi examinada na Bahia e aprovada com os maiores elogios –
esclarece Ascânio.
- Desde que gelada…
Seu Manuel serve o guaraná com canudinho, um requi nte,
e o copo com, água e gelo. O marciano aprova: realmente muito boa água, dê-me
um pouco mais, por favor, e diga quanto devo.
A um sinal de Ascânio, seu Manuel curva-se:
- Não é nada… Foi um prazer…
- Muito obrigado… Aceito por esta vez mas de futuro… É o único bar da
terra?
- Bem, no Beco da Amargura tem uma espécie de boteco, do negro Caloca.
Mas em qualquer armazém se pode vender um trago de cachaça.
- Precisa melhorar o sortimento, my friend… Boas marcas de whisky, bons
vinhos… E hotel frère – frère era Ascânio, caíra-lhe na simpatia – tem algum
bom? Com banho privativo?
- Hotel propriamente não. Mas tem uma pensão muito boa, a de dona
Amorzinho, comida de primeira, quartos limpos. Não tem banho privativo. Mas o
torneirão do banheiro vale uma ducha.
Vai ser preciso construir logo um bom hotel… - Falou o ser macho e o
dizia como se construir ali, em Agreste, um hotel de primeira, fosse a coisa
mais simples do mundo. Exactamente a partir dessa informação – dessa decisão do
super-herói – Ascânio Trindade começou a divagar.
- O pior é a estrada – constatou o ser fêmea, miando – esse último
pedaço, então… Nunca levei tanto tranco nem engoli tanta poeira… - afofa os
cabelos poeirentos, ruivos com aquela mecha platinada. – Chego em Salvador, vou
direita ao salão de Severiano lavar os cabelos e pentear….
- É só alargar e asfaltar, darling. Quantos qui lómetros
frère?
- Daqui à Bahia, à capital?
- Não só o último trecho, o carroçável.
- Quarenta e oito qui lómetros…
- Amorzinho, não minta! – rogou Miss Vénus a Ascânio. – Tem mais de
cem… Estou descadeirada. – Levou a mão bunda espacial.
- Ai! – gemeu Osnar, mas se alguém ouviu não demonstrou.
- Deve ser isso mesmo, uns cinquenta qui lómetros.
Num instante se asfalta.
Hotel, estrada asfaltada, o sonho prossegue, o coração de Ascânio se
dilata.
- Me diga uma coisa, frère: uma lancha para descer o rio até à praia
de…Como é mesmo o nome?
- Mangue Seco…
- C’est ça… É fácil alugar uma?
- Bem… Tem a lancha de Elieser. Não é de aluguel mas eu falo com ele,
peço para levá-los. É um bom sujeito.
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