sábado, junho 04, 2016

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)






Episódio Nº 24

















Ramiro ignorou este último comentário e afirmou:

 - Intriga-me a presença de um galego por aqui.

O Velho insistiu:

 - Os sarracenos preparam-se para novo ataque a Coimbra.

Ramiro limitou-se a continuar o seu raciocínio anterior:

 - O Trava quer a relíquia, quer dá-la a Afonso VII, não vai deixar que o príncipe a encontre. Terá enviado gente para isso?

O Velho encolheu os ombros, parecia cansado e murmurou:

- Os homens endoidecem com tesouros religiosos.

Aquele pensamento pessimista embalou-os nas horas seguintes e só se agitaram quando, ao atravessarem uma aldeia, um moçárabe os informou de que dias antes um grupo de galegos passara por ali em direcção ao rio Nabão, mas só o cavaleiro sem cabeça regressara.

Porém, quando lhes perguntaram se viram Abu Zhakaria, o lavrador respondeu que ninguém notara a presença do cordovês

Pai, tenho medo...

Apesar desta informação tranquilizadora, os templários de Soure redobraram a vigilância enquanto se desviavam para leste, na direcção do Nabão, procurando vestígios do solitário degolado.

E encontraram-nos... A poucas léguas do rio o Peida gorda distinguiu na estrada um despojo humano. Quando chegaram perto, o Velho desmontou e, rodando a cabeça do infeliz galego, confirmou que fora decepada por um afiado alfange.

Zhakaria esteve aqui – declarou perentório.

Ramiro mandou-os recolher a macabra descoberta para lhes darem um enterro digno junto ao resto do cadáver e depois ordenou que avançassem até ao rio Nabão.

Cuidado, avisou o Velho, ainda nos cercam.

O outro ignorou aqueles temores com uma pequena provocação.

- Com a vossa idade ainda tendes medo da morte?

Olhando em volta o Velho, relembrou os colegas de expedição:

 - Foi a cautela que me manteve vivo.

Ramiro que reagia sempre mal a quem o enfrentava, ripostou:

 - Questionais o meu comando?

O idoso templário limitou-se a sorrir multiplicando as muitas rugas que normalmente já exibia no rosto.

- Para isso é que já estou velho.

Os restantes cavaleiros ignoraram aquela suave celeuma, pois todos gostavam do Velho e o respeitavam.

O Rato chamava-lhe curandeiro e Ramiro ouvia-o sempre em questões relacionadas com armas, alimentação ou doenças. Era um combatente antigo e bem sucedido, podia dizer o que queria.


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