(Domingos Amaral)
Episódio Nº 24
Ramiro ignorou este último comentário e
afirmou:
-
Intriga-me a presença de um galego por aqui .
O Velho insistiu:
-
Os sarracenos preparam-se para novo ataque a Coimbra.
Ramiro limitou-se a continuar o seu
raciocínio anterior:
- O
Trava quer a relíqui a, quer dá-la a
Afonso VII, não vai deixar que o príncipe a encontre. Terá enviado gente para
isso?
O Velho encolheu os ombros, parecia
cansado e murmurou:
- Os homens endoidecem com tesouros
religiosos.
Aquele pensamento pessimista embalou-os
nas horas seguintes e só se agitaram quando, ao atravessarem uma aldeia, um
moçárabe os informou de que dias antes um grupo de galegos passara por ali em
direcção ao rio Nabão, mas só o cavaleiro sem cabeça regressara.
Porém, quando lhes perguntaram se viram
Abu Zhakaria, o lavrador respondeu que ninguém notara a presença do cordovês
Pai, tenho medo...
Apesar desta informação tranqui lizadora, os templários de Soure redobraram a
vigilância enquanto se desviavam para leste, na direcção do Nabão, procurando
vestígios do solitário degolado.
E encontraram-nos... A poucas léguas do
rio o Peida gorda distinguiu na estrada um despojo humano. Quando chegaram
perto, o Velho desmontou e, rodando a cabeça do infeliz galego, confirmou que
fora decepada por um afiado alfange.
Zhakaria esteve aqui
– declarou perentório.
Ramiro mandou-os recolher a macabra
descoberta para lhes darem um enterro digno junto ao resto do cadáver e depois
ordenou que avançassem até ao rio Nabão.
Cuidado, avisou o Velho, ainda nos cercam.
O outro ignorou aqueles temores com uma
pequena provocação.
- Com a vossa idade ainda tendes medo da
morte?
Olhando em volta o Velho, relembrou os
colegas de expedição:
-
Foi a cautela que me manteve vivo.
Ramiro que reagia sempre mal a quem o
enfrentava, ripostou:
-
Questionais o meu comando?
O idoso templário limitou-se a sorrir
multiplicando as muitas rugas que normalmente já exibia no rosto.
- Para isso é que já estou velho.
Os restantes cavaleiros ignoraram aquela
suave celeuma, pois todos gostavam do Velho e o respeitavam.
O Rato chamava-lhe curandeiro e Ramiro
ouvia-o sempre em questões relacionadas com armas, alimentação ou doenças. Era
um combatente antigo e bem sucedido, podia dizer o que queria.
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