A propósito dos dois comandos mortos durante a instrução, esta semana, estou à vontade para falar no assunto, porque no início da década de sessenta fui por duas vezes a Lamego tirar aquele Curso no âmbito da preparação militar para a guerra de África.
Atravessei rios, de noite, agarrado a uma corda, dormi na serra,
se me tivesse sido possível... apenas com um fato Zuarte em cima da pele,
atirei-me do sino da Igreja agarrado a uma roldana e no fim de um dia de
instrução, um colega meu, de exausto, deixou-se adormecer debaixo da agua
quentinha do chuveiro...
Sei, portanto, do que falo. Nessa época, ainda fumava e a minha
capacidade respiratória estava diminuída pela nicotina e outras porcarias do
tabaco que me levariam, muitos anos mais tarde, a acabar com o vício, para além
de que não tinha qualquer espécie de preparação física pois nem de simples
aulas de ginástica beneficiara durante o liceu.
Com toda a justificação, ao contrário de agora, esses Cursos de Comandos
eram pensados para uma guerra nas selvas e no capim de África, com muito calor,
humidade, e eu recordo bem o grau de exigência física que era necessário
despender durante uma operação de 48 horas no mato, que eu acabava de "rastos", durante a guerra que me calhou em sorte, em Angola, para onde marchei "de
pressa e em força”... a ordens do Salazar.
No entanto, apesar de tudo isso, considerando ainda que um dos meus
instrutores era o célebre Ten. Carmelo, recém-chegado da Argélia, onde
frequentara um Curso de Guerra Subversiva, todos os restantes instrutores e respectivos
comandantes superiores, alguma vez deram uma ordem que não fosse no sentido da
nossa preparação militar e, muito menos, para humilhar algum de nós.
Hoje, leio aqui lo que
foi dito por estes instrutores, em estilo de ordens, a instruendos, num dia de
muito calor, recusando-lhes, ainda por cima, água para beberem, e pasmo porque
aqui lo só é possível em pessoas que
fazem da sua vida profissional um exercício de demência.
Eu sei o que é não ter água para beber em pleno esforço físico, eu
sei o que é deitar novamente a água da boca, depois de enxaguada, de novo para o
cantil, eu sei o que foi testar a solidariedade de soldados amigos que
repartiram a sua água comigo, eu sei de todas estas histórias à volta da água
em cenas de guerra, nos matos de Angola... e sobre elas o que recordo,
principalmente, foram princípios humanos, exemplos de amizade altruísta.
Hoje, o que leio, é uma vergonha de comportamentos de homens que
envergam uma farda, a mesma que um dia vesti por obrigação em defesa da pátria
do Minho a Timor... e, já agora, deixem-me desabafar: esta geração não vale a minha,
a dos anos sessenta, como se a instrução e a melhor qualidade de vida dos dias
de hoje, tenham retirado aos jovens a sua pureza e sentido de responsabilidade,
característica desses tempos.
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