sexta-feira, fevereiro 06, 2009


A Crise é Má Conselheira





Nada fará mudar a natureza humana quando se trata de sobreviver.

São comportamentos ou reacções, talvez mais estas, instintivas que obedecem a leis que se inscrevem em padrões de sobrevivência muito anteriores à própria civilização.

Quando se trata de sobreviver parece que o mundo é demasiado pequeno… os horizontes estreitam-se.

De certa forma, parece que foi isso que os trabalhadores ingleses apoiados pelos respectivos sindicatos nos quiseram dizer há dias, quando se manifestaram e fizeram greves de protestos contra a contratação de portugueses e italianos para uma empreitada de uma empresa francesa a operar no Reino Unido:

-… “Desculpem lá, isto não tem nada de pessoal, mas estamos na nossa terra e temos que defender os nossos empregos…” dizia o trabalhador inglês ao ser entrevistado para a televisão, a modos de quem pede desculpa.

Os trabalhadores portugueses regressaram a Portugal e ao falarem para a TV mostraram-se perfeitamente conformados, pensando lá para com eles:

- “…na nossa terra teríamos feito o mesmo.”

No fundo, é um procedimento de género idêntico ao que resulta das palavras do Presidente Obama quando pede ou estimula os seus concidadãos a comprarem americano e muitos outros países europeus a lançaram campanhas à aquisição de bens e serviços nacionais.

É verdade que a Comissão Europeia já assinalou que irá analisar a conformidade das novas regras americanas com os compromissos assumidos no âmbito da Organização Mundial do Comércio.

E também é verdade que no plano interno europeu irá ser prestada atenção às medidas que os Estados venham a tomar em violação do princípio da não descriminação.

É natural, portanto, que todas estas reacções proteccionistas com repercussões no mercado de trabalho venham a ocupar nos próximos tempos a agenda dos que têm que tomar decisões políticas.

O Dr. António Vitorino, face a estes comportamentos, afirma, com toda a razão que lhe assiste, que não só estamos a tornar mais difícil a saída da crise como, igualmente, a atentar contra valores civilizacionais.

Na verdade, uma medida proteccionista favorece no curto prazo mas prejudica no médio e longo prazo. A crise é global e tudo quanto possa contribuir para diminuir os fluxos comerciais internacionais de produtos e serviços, prolongará e agravará a crise.

No plano civilizacional é, realmente, um retrocesso, um voltar atrás, ao tempo do cada um por si mas, como resistir nestes tempos de sobrevivência a estas atitudes?

Lembramo-nos todos, quando ainda não há muitos meses, duas cidades no norte de Portugal disputaram duramente entre si, a instalação de uma fábrica que iria criar postos de trabalho em qualquer um dos concelhos em que viesse a instalar-se.

Estávamos no mesmo país, até na mesma região, mas nenhum cidadão de qualquer um dos dois Concelhos teria levado a bem que o seu Presidente não tivesse feito tudo para “ganhar a fábrica para si”.

É inevitável… a expressão do trabalhador inglês ao justificar a sua luta pelos postos de trabalho que iriam ser criados, ali, na sua terra, não demonstrava nenhuma animosidade contra os candidatos portugueses ou italianos, apenas uma reivindicação que a ele lhe parecia completamente justa.

O Dr. António Vitorino reconhece a delicadeza do momento e escreve:

- “A situação em causa espelha a angústia e insegurança dos trabalhadores britânicos perante o espectro do desemprego e revela que há dinâmicas que, uma vez desencadeadas não são facilmente reversíveis, além de abrirem as portas para práticas retaliatórias que, no limite, ainda agravarão mais a situação de crise em que vivemos”.

Por extensão, podemos dizer que uma crise financeira origina outras crises de natureza moral, perigosas, que têm a ver com princípios e até com a própria racionalidade. Nenhum país sairá sozinho da crise.

Graves responsabilidades para as Organizações Internacionais uma vez que as nacionais não têm força ou coragem para as verdadeiras soluções que nunca serão fáceis.

A Crise é Má Conselheira.

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