sábado, janeiro 22, 2011

TEREZA
BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA


Episódio Nº 11


Sozinho tinha posto fim ao bafatá, rindo e falando alto, dirigindo-se a presentes e ausentes, pessoas e encantados; emérito no jogo da capoeira. Quando o tipo da polícia sacou do revólver, ameaçando atirar, nessa hora Flori desligou a luz e a responsabilidade fez-se colectiva e assim inexistente; quem pode dar testemunho do sucedido no escuro? O caboclo então lhe tomou a arma num passe de mágica e, se o secreta não houvesse espatifado a focinheira no chão, até se poderia dizer, não passando por mentiroso, tê-lo feito sem uso de pernas e mãos, na pura delicadeza. Assim solto no ar, gigantesco pássaro de músculos, Januário Gereba – Gereba não vem de Yereba, o gigante? Gereba não é o urubu-rei, o grande voador? Assim Tereza o conheceu e soube. Foi quanto bastou para saber.

Com as luzes apagadas o sarilho cresceu e se ampliou; sem serem chamados, vários fregueses de enxeridos, por esporte e gosto, se meteram no rolo. Por pouco tempo, nem deu para esquentar. Ao grito de “lá vem a cana”, aviso transmitido da rua, dispersaram-se os contendores antes da chegada dos reforços da polícia que um dos guardas saíra a buscar. No escuro, viu-se Tereza suspensa da terra, por dois braços segura, a assim transportada escada abaixo e rua afora, dobrando esquinas, entrando em becos, saindo adiante, numa carreira silenciosa, no peito do gigante um cheiro salgado; finalmente posta de pé muitas quadras além, no sossego de um canto da rua. Diante dela o caboclo a sorrir:

- Januário Gereba, a seu serviço. Na Bahia, mais conhecido põe mestre Gereba, mas quem me quer bem me chama Janu.

Quando ele sorri, desce a paz sobre o mundo:

- Lhe trouxe nesta tropelia para evitar a polícia, que polícia não presta nem lá nem aqui, nem em parte nenhuma.

- Obrigado Janu – disse Tereza; bem-querer não se compra, não se vende, não se impõe com faca nos peitos nem se pode evitar: bem-querer acontece.

Ele lhe recorda alguém, pessoa conhecida, quem será? De profissão homem do mar, mestre de saveiro, seu porto é Bahia, as águas de Todos-os-Santos e o rio Paraguaçu; no cais da Rampa do Mercado deixou ancorado seu saveiro, de nome Flor das Águas.

Gigante de facto não era, como lhe parecera na briga, mas bem pouco lhe falta. Do peito de quilha, dos olhos a rir, das grandes mãos calosas, de todo ele, plantado nos pés, mas gingando à brisa, decorre uma sensação de calma – aliás não precisamente de calma, Tereza corrige o pensamento: decerto ele é capaz de imprevistos e explosões; uma sensação de segurança, de definitivas certezas. Meu Deus, com quem se parece esse homem saído do mar?

Não que se pareça de rosto, de físico, mas lembra, recorda alguém por demais conhecido de Tereza. Tereza que a seu lado, na rua não se assemelha à moça exaltada da briga, num acanhamento modesto, ouvindo-o contar: entrara no paris Alegre a tempo de vê-la cuspir na cara do xereta e enfrentá-lo, mulherzinha valente de se tirar o chapéu.

- Seu valente nada… Mais bem medrosa, só que não ver homem bater em mulher.

- Quem bate em mulher e persegue menino não é flor que se cheire – concorda o gigante – só que eu não vi o começo do arranca-rabo. Então, foi assim?

Ali em Aracaju se encontra meio por acaso, para servir a um amigo, dono da barcaça Ventania, a quem falhara, por doença, o marinheiro no dia da partida marcada como sem falta, pois o dono da mercadoria tinha a maior pressa, não aceitando delongas,

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