segunda-feira, junho 27, 2011

TEREZA

BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA


Episódio Nº 137


Em língua de sotaque e debique, apelidaram-na Tereza Providência Divina alguns raquíticos maconheiros de cuja senha e impotência Tereza libertou, em certa noite de praia no Recife, estouvada ginasiana. A curiosidade da adolescente transformou-se em medo e ela clamara pelo auxílio da providência divina em berros ouvidos por muita gente, mas cadê coragem para enfrentar a mal afamada corja de viciados? O melhor é não se meter, estes tipos são perigosos, aconselharam os prudentes parceiros de noitada, mas Tereza fez caso omisso às advertências – com ela perto, podendo intervir, mulher nenhuma, menos ainda menina, seria comida a pulso, na violência – e coube-lhe razão, pois os sebentos reduziram-se a graçolas, insolências, xingos inconsequentes: olha a divina providência, guarda civil de babaca, paraíba.

Dopados e covardes, largaram a bisbilhoteira e sumiram na náusea. Nada disso, porém, era consolo para a tristeza perene: nem passeios, nem pândegas, nem farras, nem embelecos, nada matava a saudade maltratando no peito.

Na terra e no mar, a sombra de Januário Gereba, dissolvida na aurora. Muito por baixo, sem graça e sem entusiasmo retornara Tereza Batista.

Flori Pachola, dono do Paris Alegre e bom amigo, também ele andava de crista murcha no que se refere a negócios: movimento fraco, falta geral de dinheiro, não tinha condições para contratar ao mesmo tempo duas estrelas para a pista iluminada do cabaré. Duas, sim, porque indo mal de negócios ia bem de amores o empresário: o coração em alvoroço devido à presença no estabelecimento de artista nova, Rachel Klaus, ruiva de farta cabeleira, em cujo colo pintalgado de sardas, Flori, por fim, superara a desesperada paixão por Tereza; durante meses seguidos roera a maior dor de cotovelo, de olhos doces na moça de cobre, a lhe pedir e suplicar, e ela, sempre gentil e risonha, a negar-se, inabalável. Da tristeza, da mágoa, do acabrunhamento resultantes da intransigência e da posterior partida de Tereza, foi salvo a tempo com a chegada à cidade de Raquel Klaus, cantora de blues, gaúcha e friorenta, candidata a exibir-se no Paris Alegre e a acalentar-se nos braços do melancólico proprietário: reerguendo das cinzas de Tereza o cabaré e o cabaretier. E os demais amigos? O poeta Saraiva andava pelo sertão em busca de melhor clima onde falecer, o pintor Jenner Augusto partira para a Bahia na esteira da glória, o famoso protésico Jamil Najar, noivara e ia-se casar com rica herdeira em quem efectuara cinco notáveis obturações. Quanto a Lulu Santos, o mais querido de todos, caíra morto, insólita e repentinamente, na tribuna do júri, quando defendia um pistoleiro alagoano.

Em Aracaju, sem amigos e sem trabalho, esmorecida, viu-se Tereza novamente alvo daquelas propostas daquele ricaço anteriormente referido, o homem mais rico de Sergipe, na opinião dos peritos em fortunas alheias, industrial, senador e femeeiro.

Insistente, mal habituado a obter com rapidez quanto desejava, tornou-se desagradável, ameaçando fazer-lhe a vida impossível se ela não cedesse às suas promessas, aliás generosas. A caftina Veneranda não lhe dava repouso: só uma louca de hospício recusaria a protecção do graúdo.

Louca de hospício, na casa do sem jeito e um tantinho impressionada com a figura do jovem médico, bonitão e bem falante, disposta a não render-se ao pai da pátria (amásia de homem de idade, nunca mais, não voltaria a correr o risco), Tereza decidiu-se e aceitou o convite do doutorzinho para acompanhá-lo a Buquim, sem compromisso de demora ou permanência, de amarração duradoura, em aventura de pouca consequência.
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