sexta-feira, dezembro 21, 2012

Agarrada à agulha, Gabriela, parece agora, fora de cena...

GABRIELA
CRAVO
E
CANELA

Episódio Nº 170


Com tal vida, nesse tempo todo não depositara no banco. Cumprira seus compromissos com seus fornecedores, mas devorara os lucros numa boémia cara. Antigamente ia ao cabaré uma ou duas vezes por semana, dormia com mulher enrabichada por ele, sem gastar quase nada.

Mesmo depois de casado, com tanta coisa dada a Gabriela, fora-lhe possível separar cada mês uns contos de réis para a futura roça de cacau. Resolveu por fim àquela vida devassa e ruinosa.

Pôde tranquilamente fazê-lo, não mais o torturava a ausência de Gabriela, o medo de ficar sozinho, já não procurava sua perna e anca redonda onde descansar. Sentia falta, e cada vez mais, era da cozinheira.

Felizmente nem tudo era negativo no balanço. O reservado no pocker, com a dinheirama a correr naquele ano, deixava bom lucro. Agora, com a volta de Amâncio Leal e de Melk às boas relações com Ribeirinho e Ezequiel, o reservado funcionava diariamente, entrando a roda de Pocker pela noite dentro, indo por vezes até de manhã. Jogavam alto, o barato da casa crescia.

E havia o Restaurante, no qual Mundinho pusera o dinheiro e Nacib o trabalho e a experiência. Lucros divididos e certos pois não teria concorrentes. A comida nos hotéis era infame. Além do mais, à noite, a sala do restaurante funcionaria para o pocker, o sete e meio, a bisca, o vinte e um, os jogos de baralho aos quais os coronéis eram aficionados, preferindo-os mesmo à roleta e ao bacará dos cabarés. Ali poderiam divertir se discretamente.

O pior mesmo era a falta de cozinheira. O andar já estava pintado, dividido em sala, copa e cozinha, as mesas e cadeiras prontas, o fogão construído, pias para lavar pratos, mictórios para os fregueses. Tudo do melhor. Do Rio haviam chegado as encomendas: máquina para fazer sorvete, frigorífico onde guardar carnes e peixes, fabricando seu próprio gelo. Coisas de luxo, nunca vistas em Ilhéus, os fregueses do bar estatelavam-se em admiração.

Em breve estaria tudo montado, só faltava cozinheira. Naquele dia, quando a suprema autoridade criticara tão asperamente os salgados do bar, Nacib decidiu conferenciar com Mundinho sobre o assunto.

O exportador dedicava grande interesse ao restaurante. Era de comer bem, vivia reclamando a bóia dos hotéis, mudando de um para outro.

Também ele, Nacib, estava a par, mandara oferecer ordenado de rei a Gabriela. Discutiu o assunto com o árabe, propôs mandar buscar um cozinheiro no Rio, experiente em restaurantes. Era a única solução. Em Ilhéus arranjariam ajudantes, duas ou três cabrochas.

Nacib torceu o nariz: esses cozinheiros do Rio não sabiam fazer comida baiana, cobravam um dinheirão. Mundinho, porém estava encantado com a ideia: um mestre-cuco vestido de branco, gorro na cabeça, como nos restaurantes do Rio.

Vindo falar com os fregueses, recomendar-lhes pratos. Mandou um telegrama urgente a um amigo seu.

Nacib, ocupado com os últimos e complicados detalhes de arrumação do restaurante, voltava à sua vida antiga: ia ao cabaré raramente, dormia com a amazonense quando lhe sobrava tempo e ela estava livre. Apenas desembarcasse o cozinheiro do Rio e marcaria a data da inauguração solene do Restaurante do Comércio.

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