Não, sereia não pode ser... |
GABRIELA
CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 171
Muita gente subia, na hora
do aperitivo, a escada ligando os andares para extasiar-se ante a sala
ornamentada de espelhos, o imenso fogão, o frigorífico, aquelas maravilhas.
O cozinheiro chegou, via
Baía, junto com Mundinho Falcão, no mesmo navio. O exportador fora à capital, a
convite do Governador, discutir a situação política e resolver problemas das
próximas eleições. Levara Aristóteles, voltavam vitoriosos.
O Governador cedera em
tudo: Victor Melo abandonado ao seu destino, Dr. Maurício igualmente. Quanto a
Alfredo retirara a sua candidatura a deputado estadual, em seu lugar
apresentara-se o Dr. Juvenal de Itabuna, sem nenhuma chance. Na realidade, a
campanha eleitoral estava terminada, os oposicionistas passavam a ser governo.
Nacib embasbacou-se ante o
cozinheiro. Estranha criatura: gordote e troncudo com um bigodinho encerado de
pontas finas, tinha uns ademanes suspeitos, uns modos efeminados.
Importantíssimo, com uma
arrogância de grão – duque, exigências de mulher bonita, preço alucinante.
João Fulgêncio dissera:
- Isso não é um cozinheiro, é o próprio
Presidente da República.
Português de nascimento,
de sotaque pronunciado, muitas das palavras a caírem depreciativas de seus
lábios, eram francesas. Nacib, humilhado, não as entendia. Chamava-se Fernand
com d no fim.
O seu cartão de visita –
guardado carinhosamente por João Fulgêncio para juntá-lo ao do «bacharéis»
Argileu Palmeira – dizia: Fernand – Chef de cuisine.
Acompanhado de alguns
curiosos fregueses do bar, Fernand subiu com Nacib a examinar o restaurante.
Balançou a cabeça ante o fogão:
- Três mauvais…
- O quê? – sucumbia Nacib.
- Ruim, merdoso… - traduzia João Fulgêncio.
Exigia fogão de metal, a
carvão. Quanto antes. Deu prazo de um mês sem o que iria embora. Nacib suplicou
dois meses, tinha de mandar vir da Baía ou do Rio. Sua Excelência concedeu num
gesto superior, reclamando ao mesmo tempo uma série de apetrechos de cozinha.
Criticou as comidas
baianas, indignas, segundo ele, de estômagos delicados. Criando logo profundas
antipatias. O Doutor saltara logo em defesa do vatapá, do caruru, do efó.
- Sujeitinho armado em besta – sussurrou.
Nacib sentia-se humilhado
e amedrontado. Ia dizer qualquer coisa, o chef de cuisine aplicava-lhe um olho
crítico, superior deixando-o gelado.
Não fosse o homem ter
vindo do Rio, custar tanto dinheiro e, sobretudo, ter sido ideia de Mundinho
Falcão, e o mandaria estourar-se no inferno com suas comidas de nomes
complicados e suas palavras francesas.
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