terça-feira, dezembro 03, 2013

Francisco, o Papa:  Esta economia mata.
Evangelii

 Gaudium








Vivemos na economia da exclusão e da desigualdade social. Esta economia mata. Não é possível que a morte por enregelamento dum idoso sem abrigo não seja notícia, enquanto o é a descida de dois pontos na Bolsa. Isto é exclusão. Não se pode tolerar mais o facto de se lançar comida no lixo, quando há pessoas que passam fome. Isto é desigualdade social.

 Hoje, tudo entra no jogo da competitividade e da lei do mais forte, onde o poderoso engole o mais fraco. Em consequência desta situação, grandes massas da população vêm-se excluídas e marginalizadas: sem trabalho, sem perspectivas, num beco sem saída. O ser humano é considerado, em si mesmo, como um bem de consumo que se pode usar e depois lançar fora.

Assim teve início a cultura do «descartável», que aliás chega a ser promovida. Já não se trata simplesmente do fenómeno de exploração e opressão, mas de uma realidade nova: com a exclusão, fere-se, na própria raiz, a pertença à sociedade onde se vive, pois quem vive nas favelas, na periferia ou sem poder já não está nela, mas fora. Os excluídos não são «explorados», mas resíduos, «sobras».

Neste contexto, alguns defendem ainda as teorias da «recaída favorável» que pressupõem que todo o crescimento económico, favorecido pelo livre mercado, consegue por si mesmo produzir maior equidade e inclusão social no mundo.

Esta opinião, que nunca foi confirmada pelos factos, exprime uma confiança vaga e ingénua na bondade daqueles que detêm o poder económico e nos mecanismos sacralizados do sistema económico reinante. Entretanto, os excluídos continuam a esperar. Para se poder apoiar um estilo de vida que exclui os outros ou mesmo entusiasmar-se com este ideal egoísta, desenvolveu-se uma globalização da indiferença.

Quase sem nos dar conta, tornámo-nos incapazes de nos compadecer ao ouvir os clamores alheios, já não choramos à vista do drama dos outros, nem nos interessamos por cuidar deles, como se tudo fosse uma responsabilidade de outrem, que não nos incumbe. A cultura do bem-estar anestesia-nos, a ponto de perdermos a serenidade se o mercado oferece algo que ainda não comprámos, enquanto todas estas vidas ceifadas por falta de possibilidades nos parecem um mero espectáculo que não nos incomoda de forma alguma.»


José Saramago, nosso Prémio Nobel da Literatura, ateu e comunista, teria aplaudido estas palavras, tê-las-ia mesmo subscrito o que significa que Francisco, embora chefe de uma Igreja que quase sempre viveu no mundo dos anjos e dos ricos desceu à terra, à sociedade, aquela em que vivemos agora, e mergulhou fundo numa mais do que crítica, numa dura acusação:

 - "Vivemos na economia de exclusão e da desigualdade. Numa economia que mata."

E não venham agora as tradicionais vozes da Igreja afirmar: "Mas nós sempre dissemos isto. Não há aqui novidade. O Santo Padre limita-se a sublinhar algo que já há muito faz parte da nossa doutrina."

Apetece dizer: "pois... pois... está bem, está bem..." mas eu nunca ouvi uma denúncia Papal com esta clareza de pensamento."

 - "Não é possível que a morte por enregelamento de um idoso sem abrigo não seja notícia enquanto o é a descida de dois pontos na Bolsa." Notável...
(continua)

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