terça-feira, janeiro 20, 2015

Comiam em sua mão...
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)

Episódio Nº 151




















Dalila estendeu a mão com que limpara o olho e a estalou na cara de Epifânia. Agarraram-se pelos cabelos, trocaram sopapos, se atracaram aos xingos e unhadas.

 Formou-se em torno roda animada e galhofeira a incentivar as contendoras.

- Boto dinheiro na do cuzão -  Desafiou Misael honrando sua dama.

 - Topo dois tostões -  Aceitou Guido não menos cavalheiro.
Sem parar de tocar, Pedro Cigano levantou-se do comprido
banco de madeira, obra de Lupiscínio, onde estivera sentado em companhia de Zuleica, e veio se colocar na roda.

Vale a pena registrar que em momento algum, nem mesmo quando o banzé esteve a pique de generalizar-se, o tocador deixou de dedilhar a sanfona numa espécie de acompanhamento musical executado em surdina.

 Não obstante estar a zero, arriscou um cruzado em Epifânia, tão certo se encontrava do resultado. Bastião da Rosa cobriu a aposta por puro espírito esportivo, para animar a competição, sem alimentar ilusões sobre o recebimento daqueles quatrocentos réis: Pedro Cigano devia a Deus e a meio mundo.

Conforme opinou Guido, as apostas ficaram naturalmente anuladas quando Zuleica entrou na liça surpreendendo a todos menos a Coroca.

Dalila parecia à beira da derrota; com um safanão Epifânia arrancara-lhe a saia de chita - a velha, pois a nova ela reservara para o São João - deixando-a de traseiro à mostra para gáudio da platéia.

Sem saber como reagir, viu-se Dalila na iminência de abandonar o campo de batalha. Nesse momento, levantando- se do banco de onde acompanhara as peripécias do emboceto,
Zuleica agrediu Epifânia a pontapés; levava a vantagem de calçar tamancos.

 Sentindo-se apoiada, Dalila, rebolando o rabo nu, voou novamente para cima da rival. A roda aplaudiu com ditos, palmas e assovios.

- Duas contra uma, sinhas frouxas. Vou dar nas duas. Mas Epifânia não as enfrentou sozinha: a pequena Cotinha, solidária, se meteu na briga e revelou inesperada valentia.

Rolaram as quatro no chão, emboladas; além do cu de Dalila viam-se os peitos de Epifânia: desabotoara-se a bata de baiana.

Com a intervenção de Zuleica ficou patente o verdadeiro motivo do bafafá, ao ver do mulherio motivo justo para não dizer sublime: o negro Castor Abduim da Assunção ali bem do seu, na maior manemolência.

Por ele suspiravam, se xingavam e se batiam: comiam em sua mão.

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