quinta-feira, janeiro 15, 2015

Cuspiu no chão, passou o pé em cima
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)


Episódio Nº  147

















Tição soltou a voz, os olhos postos em Zuleica como se não houvesse mais ninguém presente:

Maria tu vais casares
E eu vou te dares os parabéns.
Vou te dares uma prenda, ai ai
Saia de renda, ai ai
De dois vinténs...

Tanto bastou para que Epifânia, sentada ao lado do negro, se retirasse numa rabanada raivosa. Se implicava com as outras, que dizer dessa fingida? Cuspiu no chão, passou o pé em cima.

8

O fovoco, inventado por Pedro Cigano para alegrar a noite de Santo Antônio, terminou em pancadaria, bala e sangue.

Devese todavia levar em conta não ter havido intenção mesquinha, vil interesse de dinheiro na aliciante proposta do troca-pernas.

 Se o arrasta-pé rendesse qualquer dez réis, melhor. Não pensara nisso, porém, ao empunhar a harmônica; desejara apenas celebrar condignamente santo dos mais merecedores.

Argumentou e convenceu, mas não cabe responsabilizá-lo pelo que veio a acontecer. Aliás ninguém o fez.

Em verdade, ao arribar no lugarejo naquele dia chuvoso e friorento, não pensava demorar-se mais de uma noite, dormida se possível na esteira de uma quenga que lhe esquentasse a carcaça.

Seu destino era Taquaras se não fosse Ferradas, Água Preta, Rio do Braço ou Itabuna, ele próprio não levava certeza.

Almejava brincar as festas de junho onde pudesse divertir-se a grande e grátis, comendo, bebendo e dançando à la vonté.

Mas ao deparar com os preparativos do São João em Tocaia Grande se empolgou.

Os preparativos já em si foram uma festa. Ocuparam durante bem mais de uma semana todo o tempo livre da reduzida população que parecia multiplicar-se no remate de tantas e tão diversas empresas.

 De volta para as fazendas, os tropeiros utilizaram cangalhas e caçuás vazios para neles transportarem o que não se podia adquirir no cacete armado de Fadul: as mãos de milho verde, o coco seco, os foguetes e os fogos: bombas, buscapés, espadas, incluindo estrelinhas e outros caprichos infantis das raparigas.

 Sem falar no balão, pois o balão era um segredo compartilhado apenas por Tição e Coroca, ninguém mais sabia de sua existência.

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