Portugal
(Domingos Amaral)
Episódio Nº 29
Conversavam sobre as cidades
que visitavam, as manias dos fregueses, o que se passava na taifa de Badajoz,
que dominava Santarém e Lisboa, ou no Condado de Portucalense, onde mandava uma
mulher chamada Teresa, que era filha de Afonso VI. E, nessa manhã, o pai
morrera à sua frente e Mem estava perdido.
Na véspera, os berberes
insinuaram que fora o almocreve que deitara veneno na água, mas isso era
absurdo, como todos perceberam quando o pai também adoeceu.
Um dos chefes berberes
obrigou os doentes a afastarem-se para uma zona junto ao rio, dizendo que assim
não contaminariam os saudáveis.
O pai, encolhendo os ombros,
dissera a Mem que não se preocupasse. Porém, durante a última noite, Mem
verificara que o pai continuava na mesma, mas havia outros que pareciam em
muito mau estado.
Tinham febre e o seu número
aumentavam, alarmando os que os vigiavam.
Pela manhã, mal o sol
nascera, um dos berberes havia ordenado aos doentes que se fossem lavar ao rio.
Viu-se que os guerreiros
estavam com medo e queriam-nos longe.
O pai já não tinha vómitos,
embora ainda sentisse dores. Sorrindo sugeriu a Mem que fosse nadar enquanto
ele ia fazer as suas necessidades.
Nunca ficava à vontade
nestes momentos e o rapaz viu-o procurar uns arbustos para se poder aliviar
atrás deles.
Mem tirara a camisa de linho
e os calções e as alpercatas e lançara-se ao rio. A água não estava muito fria
e ele sabia nadar, por isso deu umas braçadas, sentindo-se límpido e puro,
cercado por aquela água saborosa.
Ficou uns minutos por ali, a
boiar, o cérebro vazio, só os seus sentidos a apreciarem o momento.
Quando se ergueu e olhou
para a margem, percebeu que algo de estranho estava a acontecer, pois viu um
alto todo vestido de branco, com um alfange nas mãos a degolar um doente.
Observou-o a dar mais uns
passos e quando outro doente, nu, saiu da àgua o carrasco branco avançou e, num
gesto brusco, fez-lhe saltar a cabeça com uma rapidez impressionante.
Depois correu, deu um salto
por cima da vegetação e matou outro enfermo.
Com puro pânico, Mem olhou
para os arbustos, atrás dos quais estava o pai nos seus afazeres íntimos.
O torcionário de branco
começava a eliminar os doentes, um a um, e o terror do rapaz cresceu quando o
viu aproximar-se da zona para onde o pai fora.
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