(Domingos Amaral)
Episódio Nº 55
Era sangue de galinha,
untaram-no para parecer Jesus, disse-me depois o prior. Com aquelas barbas tão
sujas e tanta lama até estava idêntico a um Cristo, mas na verdade Teotónio
sentia-se desiludido com o lavrador, faltava-lhe gravidade para um papel tão
importante.
Pegava na cruz como quem
leva distraidamente uma saca vazia e estava sempre a olhar para os secundários,
vestidos de soldados romanos, esquecendo suas obrigações.
Por uma vez, quando vinha a
caminho do altar, o prior até o vira a sorrir ao centurião!
- Que descarado! O Jesus do ano passado tinha
mais jeito! - comentou ele connosco depois da missa.
Já incomodado com aquela
fraca prestação, o prior ainda mais se desiludiu quando, ao vê-lo ser pregado
na cruz, numa trave improvisada, com falsos pregos pregados por falsos
soldados, reparou que Dona Teresa nem sequer olhava para o teatro da paixão, embevecida
como estava com o trava.
- Que afronta, passar a
Páscoa na minha igreja ao lado do amante! Comentaria ele depois.
Era uma desonra para o
Condado ter como condessa uma mulher que se deitava com um homem casado, e
ainda por cima galego!
Quando os vira entrar na
Igreja sorridentes e de braço dado, Teotónio ainda pensara em correr com eles
dali aos gritos, mas o Jesus já entrara pela porta principal e os olhos dos
presentes tinham-se virado para lá.
Passara o momento de lhes
passar um sermão castigador.
Na missa era tempo de silêncio,
mas como a igreja estava cheia ouvia-se o rumor das conversas e das risadas.
Do lado direito da nave
central, encontrava-se a família Trava. Na primeira fila, Fernão Peres, ao lado
de Dona Teresa, e Bermudo, junto à sua esposa, Urraca Henriques.
Atrás, no segundo banco,
sentava-se Elvira de Trava, o seu marido, Gomes Nunes de Pombeiro, e ainda as
suas belas filhas de ambos, Maria e Chamoa Gomes.
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