sábado, setembro 19, 2015

O capitão a encontrou à cabeceira do doente
Tocaia Grande
(Jorge Amado)

Episódio Nº 341
















6


Na Fazenda da Atalaia, as moradas dos trabalhadores - casebres de barro batido ou de madeira - agrupavam-se entre a casa-grande e o riachão, margeando a estrada; umas poucas ficavam isoladas, esparsas nas roças mais distantes.

Natário fizera questão de passar por todas elas para comunicar a notícia e se despedir, oferecendo os préstimos; mantinha com os alugados e os tropeiros boas relações de trabalho e também de cortesia e alguns eram seus compadres.

A noite descera sobre os cacauais e a mata, e apesar do inverno não chovia, naquela noite a atmosfera estava tépida, cariciosa.

O Capitão sentia-se dominado por sentimentos opostos: de alívio e ufania, pois deixara por fim de ter patrão, e de pena e nostalgia por abandonar aquela terra onde vivera e labutara por mais de vinte anos.

Em sua peregrinação, notou luz de fifó no barraco do finado
Tiburcinho e se admirou: acabara de encontrar sia Efigênia cuidando de Idalício, jovem colhedor de cacau, mordido por uma cobra naquela tarde.

Curandeira competente, a velha prestara-lhe socorro. Enchera de fumo de corda a boca sem dentes, boca de ventosa, e a aplicara sobre a picada, no tornozelo do padecente: sugava o veneno e o cuspia, murmurando rezas:

Meu Senhor São Bento
Bata o pau na cobra
Mata essa cobra
Que a cobra é do Cão
Me livre do veneno e da tentação

Idalício queimava de febre mas resistia, a velha conseguira reduzir a quantidade de peçonha, mitigar-lhe o efeito quase sempre mortal.

O Capitão a encontrou à cabeceira do doente e ali conversou com ela antes de abandonar a Fazenda da Atalaia. Fez votos para Idalício escapar com vida, talvez conseguisse, graças aos poderes de São Bento e à sabedoria popular da rezadeira.

Falaram sobre Sacramento e sia Efigênia lamentou-se: sentia falta da filha cuja demora em Ilhéus, onde cuidava da viúva do Coronel, impedia a realização de planos alimentados desde que ela a soubera possuidora de uma casa de aluguel em Itabuna, prenda do coronel Boaventura Andrade, agradecido e magnânimo.

Da casa adquirida pelo fazendeiro e posta em nome da com escritura lavrada no cartório com todos os itens e todos os conformes, sia Efigênia e Sacramento tinham sabido por
Natário, único a par do sigiloso assunto: o Coronel não desejava que a novidade se espalhasse.

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