quinta-feira, outubro 01, 2015

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)


Episódio Nº 72



















Os outros apoiaram-no, em coro, mas subitamente emudeceram, pois apareceu uma mulher alta e loura, que transportava uma bandeja com dois jarros de vinho e quatro vasos.

Os amigos apreciaram a imponente figura que percorria a sala. Parecia uma estrangeira e não sendo perfeita de feições, pois tinha uma cara arredondada e o nariz largo, impressionava pela voluptuosidade do corpo.

Por debaixo das saias e da camisa, pressentiam-se uns seios cheios e fofos, umas ancas largas e um traseiro firme.

Enquanto ela pousava o vinho, Afonso Henriques perguntou-lhe como se chamava, e a rapariga, mais velha que o príncipe, talvez com vinte e cinco anos, disse que o seu nome era Elvira.

- E quanto cobras por levar nessa bela peideira? – Excitou-se o braganção.

 - Não sou soldadeira – respondeu a rapariga sem pestanejar.

O Braganção duvidou:

 - Ora! Ora! – Deves ter vindo com os jograis que vão cantar amanhã! Para bailares e cantares e para te pores de quatro também!

Olhando em volta, perguntou se ela tinha rufião. Havia homens que colocavam as mancebas nas estalagens, ganhando com os serviços que elas prestavam aos cavaleiros, mas Elvira negou que trabalhasse com tal regime, o que levou Gonçalo a indignar-se:

- Casaste com o taberneiro e sois-lhe fiel? – Que desperdício!

Ganhais mais a chupar gaitas do que a servir vinho!

A rapariga agarrou no tabuleiro vazio, ignorando mais uma ignomínia. Parecia habituada àquelas piadas e preparava-se para se afastar quando Afonso Henriques a interrogou:

 - De onde sois?

Ela olhou sem sorrir e disse:

 - Nasci perto de Viseu. O meu pai morreu há uns meses e tive de arranjar ofício. Antes aqui do que num mosteiro.

O príncipe fez uma pequena vénia aprovadora e comentou:

 - Não pareceis de cá tão alta e com essa cor de cabelo tão bonita.

Pela primeira vez um leve sorriso trespassou a cara de Elvira.

 - Sou descendente de normandos. Daqueles que pilhavam as vilas e entravam pelos rios adentro.

Gonçalo franziu a testa,

 - Vikings? Há mais de cem anos que não aparecem por cá!

Convicta das suas origens, Elvira retorquiu-lhe.

 - A minha mãe e a mãe dela, e a mãe da mãe dela eram como eu. Ficou-nos no sangue.

Colocou o tabuleiro vazio debaixo do braço e avisou o príncipe:

 - As soldadeiras já aviaram quem tinham de aviar.


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