Bateram em retirada |
Tocaia Grande
(Jorge Amado)
Episódio Nº 377
Nem nos tempos das lutas entre Basílio de
Oliveira e os Badarós sucedera tamanho morticínio em tão curto espaço de tempo.
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De nada adiantaria fazer acusações,
assinalar responsabilidades, incriminar esse ou aquele, de qualquer maneira
houvessem decorrido os fatos, a desproporção das forças conduziria fatalmente à
ocupação final de Tocaia Grande.
O contingente da Polícia Militar, oito
homens efetivos e mais de vinte recrutados para garantir e legitimar a
operação, sob o comando do cabo Chico Roncolho e do sargento Orígenes, somente efetuou
o grande ataque derradeiro depois da notícia da morte de Natário, quando as
forças do Capitão estavam reduzidas a seis homens válidos e a uma mulher:
Coroca, puta, parteira e lugar-tenente em substituição a Fadul e a Castor,
caídos ambos em combate.
Os afrontamentos anteriores deveram-se aos
jagunços sem uniforme - que tantas túnicas militares não possuía om
destacamento - outros vinte pelo menos: quantos foram encontrados vagando nos
caminhos, provocando desordens nos lugarejos, ameaçando deus e o mundo.
A verdade, porém, impossível ocultá-la,
manda dizer que o tresloucado gesto de Agnaldo à aparição dos primeiros
capangas determinou a carnificina inicial, marcando a partir daí o caráter cruel
da expedição, transformando a luta em matança.
Cortando por dentro a capoeira, um grupo
de jagunços, chefiados por Felipão Zureta, avançou mais rápido do que os demais
e ocupou a casa de farinha.
Natário mandou Castor atravessar o
pontilhão, à frente de quatro voluntários, Dodô Peroba, Balbino, Zé Luiz e a negra
Ressu de Iansan, santa guerreira, com o objetivo de desalojar os invasores ou
de, pelo menos, impedi-los de marchar sobre o arraial.
Sem esperar que o pelotão se aproximasse,
Agnaldo tomou da carabina e se precipitou para a casa de farinha.
Desde os longínquos e humilhantes dias de
Sergipe - a expulsão das terras em
Maroim, o mourão onde fora amarrado como um boi de abate, os bolos aplicados
com a palmatória dos escravos.
- Agnaldo sentia a sede da vingança
queimar-lhe o peito e a garganta. Bom mesmo teria sido atirar no Senador, mas,
à falta dele, os enviados dos outros senhores para manter e renovar a lei iníqua
pagariam as culpas.
Adiantou-se atirando com a carabina que,
inútil, conduzira ao ombro na travessia dos retirantes. Acertou no arcabouço de
um jagunço e em seguida tombou varado de balas, foram os dois primeiros mortos.
No passo de Agnaldo, para contê-lo, quem sabe,
despenhara-se Lia, sua mulher: recebeu uma descarga à queima-roupa, rolou em
cima do corpo do marido.
Por detrás dela surgiu Aurélio, na mão a arma
que o Capitão lhe dera; não chegou a dispará-la.
Furioso com o ataque imprevisto, Felipão
ordenou violenta represália e os cabras a iniciaram se bem não conseguissem
completá- la a contento.
Não lhes bastando liqui dar
ou colocar fora de combate Zé dos Santos e Jãozé que estavam armados, mataram a
velha Vanjé que acorria aos gritos, o moleque Nando cuja arma era um badogue e
uma das gêmeas de Dinorá: mal-equi librada
nos gambitos, a inocente estendia os bracinhos para os clavinoteiros.
Só não acabaram com as duas famílias
sergipanas - a de Ambrósio e de José dos
Santos - porque o piquete de Castor chegou
pelo outro lado e os pegou desprevenidos, pois haviam deixado o refúgio da casa
de farinha para matar mais à vontade.
Bateram em retirada.
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