(Domingos Amaral)
Episódio Nº 104
Assim, meu pai jamais se
passaria para o lado dos galegos, e o seu casamento tornava ainda mais forte a
pretensão de Dona Teresa de incluir essas terras nos seus domínios.
Nem os portucalenses mais
recalcitrantes negavam aquela argúcia.
Mal se atenuaram as
saudações aos nubentes, a rainha referiu que aquele não seria o único casamento
na família Moniz. Nesse momento Dona Teresa olhou para mim e declarou:
- A melhor espada do nosso Condado, Lourenço
Viegas, varão de Ribadouro, desposará Maria Gomes, filha de Gomes Nunes e de
Elvira Peres de Trava!
Mais aplausos se ouviram e
vi Chamoa levantar-se, emocionada, e correr a abraçar a coradíssima irmã.
Também meu amigo Afonso Henriques me abraçou, dizendo-me:
- Assim será, como era vosso desejo!
Todos naquela sala apoiavam
o meu casamento com Maria. Era uma união de um portucalense com uma Trava, mas
não ia contra os interesses do Condado.
O território de Toronho,
ambicionado por Dona Teresa, em teoria devia vassalagem a Afonso VII, mas na
realidade girava na órbita portucalense.
Embora na aparência formal
estes dois casamentos aumentassem o poder de Dona Teresa e do Trava, que
obviamente os patrocinara, a prazo mais longo eram também favoráveis às
pretensões futuras de Afonso Henriques.
A união com a Galiza era um
desejo antigo da família, que remontava pelo menos ao conde Henrique, e mesmo
tendo de aturar o Trava mais uns anos o Condado ficaria mais sólido e poderoso
se lhe adicionassem as terras de Celanova e Toronho, Límia, Astorga e Zamora.
Por isso, vi o príncipe
sorrir, e ele disse-me mais tarde que, por momentos, chegou a sentir admiração
pela mãe. Ela não só cumpria o prometido, como lhe desenhava um futuro deveras
agradável.
De repente, ouviu-se a voz
de Gonçalo que se levantara:
- Casam os meus amigos e eu
não?
A rainha sorriu-lhe. Sempre
gostara daquele amigo do filho, que considerava um brincalhão sem maldade, e
respondeu-lhe:
- Tendes a vosso lado duas mouras casadouras.
Se desejares desposar uma delas tendes de o dizer!
Os olhares dos presentes
caíram sobre as raparigas muçulmanas, Fátima e Zaida, que estavam sentadas
alguns lugares depois de Gonçalo e dividiam a mesma escudela.
Zulmira ficou aterrada ao
ouvir a sugestão da rainha, e ainda mais quando a sua filha mais velha, sem
hesitar, declarou:
- Antes me cortem o pescoço, jamais casarei
com um cristão!
O olhar brilhante e feroz de
Fátima percorreu a sala, orgulhosa, sabendo que muitos pensavam como ela.
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