quarta-feira, janeiro 20, 2016

Mãe me disse que você é minha prima...
Tieta do Agreste
(Jorge Amado)

EPISÓDIO Nº 57



















DO BANHO DO RIO COM OS SOBRINHOS, O ATREVIDO E O RECATADO

Diverte-se Tieta com os sobrinhos. Peto, um espoleta, reinador, matreiro a rondar em torno delas, da tia de São Paulo e da formosa enteada, quando não está no bar instruindo-se no que não deve. No que não deve?

- Esse menino é a minha cruz. Ponho-o de castigo, arreio-lhe a taça com vontade, nem assim. Em vez de estudar, vive no bar aprendendo porcarias… tenho um desgosto! Lastima-se Perpétua, constatando a ausência do filho menor.

- Porcarias? – Antonieta adora arreliar a irmã, escandalizá-la – pois fique sabendo que já estão ensinando essas coisas na escola, li nos jornais que vai ser obrigatório, desde o primário.

- Nas escolas, o quê?

- Aulas de educação sexual para meninos e meninas.

- Cruz credo! – benze-se, puxa do terço, o mundo está perdido.

Peto desemboca na varanda, contente da vida, o ar sonso, o olho velhaco regalando-se nos seios entre-vistos, nas pernas e coxas à mostra; vai ter uma indigestão, sorri Tieta.

Vem recordar o banho no rio, programado para aquela manhã. Perpétua ordena a Ricardo que se prepare e acompanhe a tia. Irão à Bacia de Catarina.

No caminho, carregado com os instrumentos de pesca, Peto conversa com Leonora:

- Mãe me disse que você é minha prima. É mesmo?

- Sou sim, Peto. Está contente com essa prima feiosa?

No bar, Peto escuta Osnar provocando Seixas sempre ocupado a levar as primas sempre ao cinema, ao banho de rio, a passear com elas, são várias: minha prima Maria das Dores para cá, minha prima Lurdinha para lá, minha prima Lalita chegou da roça.

Osnar cantarola a paródia de certa melodia italiana, come prima… quem tem prima come prima. No bar, aplicado, Peto se educa.

- Contente, pacas. Feiosa? Pô – o olho atrevido atravessando a saída de banho – Só é bonita. Seu Ascânio está gamado.

- Quem?

- Morda aqui – estende o dedo mínimo – diga que não sabe. Pô!

Mistura as expressões da terra com a gíria que ouve na rádio, freguês de programas de música jovem. Tieta e Ricardo ficaram para trás.

- A tia é legal, gosto dela pacas.

A Bacia de Catarina é uma pequena enseada na curva do rio, onde as margens se afastam na maior distância. A correnteza serpenteia entre pedras, seixos, rochedos, águas claras, límpido abrigo. 


Dali se avista o ancoradouro, os barcos, as canoas, a lancha de Elieser. Escondidos entre as rochas, à margem, recantos discretos, pousos de namoro e frete, o capim amassado pelos corpos.


Antigamente havia horário para homem e mulheres banharem-se separados na Bacia de Catarina, duas vezes por dia, pela manhã e à tarde.

Com o aparecimento dos maiôs e a evolução dos costumes – mesmo em Agreste os costumes evoluem – desapareceram os horários e a separação.

De manhã cedinho é certo encontrar seu Edmundo Guerreiro, Aminthas e Fidélio. Seixas na farra com Osnar até ao alvorecer, aparece mais tarde comboiando primas.

Lavadeiras batem roupa sobre as pedras. Lavadeira foi Catarina, conta a lenda

Lá vai Catarina
Com sua bacia
O patrão atrás
De fala macia
A água é fria
Quente a bacia
De Catarina


Por volta das seis surge Carol, passa em silêncio, sem dar trela a ninguém, todos espiam. A água é fria, é quente a bacia, na de Carol mergulha somente Modesto Pires, um despropósito!


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