(Domingos Amaral)
Episódio Nº 188
Santiago de Compostela, Outubro de 1127
Em frente ao monumento tumular onde há mais de trezentos anos repousavam as ossadas do apóstolo Santiago, Afonso Henriques e Afonso VII, ambos ajoelhados, rezam uma oração.
As comitivas tinham vindo juntas, desde
Guimarães, atravessando o Rio Minho em Tui, e seguido a estrada que tantos
peregrinos tomavam até àquela a que chamavam a Roma do Ocidente.
Na igreja, eu estava suficientemente perto
para escutar a conversa entre primos que se seguiu. Terminada a reza, Afonso
VII, recordou os tempos de infância, quando haviam brincado ali, em dias de
festas religiosas.
Depois queixou-se da balbúrdia que herdara
na Península, culpando Dona Urraca.
Não sei o que pensais de vossa mãe, mas a
minha era impossível! Com os homens, então, que desatino! Era um atrás do
outro, nobres e condes, e sei lá mais quantos! Até com o confessor se aviava!
Afonso Henriques, notando semelhanças,
comentou:
-
Deve ser de família.
- O
que lhes corre nas veias? Vinho? – gozou Afonso VII.
Declarou-se de acordo com o arcebispo
Gelmires: as mulheres não sabiam governar! Eram loucas e inconstantes,
perdiam-se de amores e enciumavam-se, gerando conflitos inúteis e terríveis.
- Deus me perdoe mas desejei tantas as
vezes a morte de minha mãe! Demorou, mas Ele ouviu-me! – congratulou-se o rei.
O príncipe olhou-o, satisfeito, pois o
preconceito do primo servia-lhe na perfeição, e relembrou suspeitas antigas:
- Dizem que vossa mãe terá envenenado o
meu pai com peçonha em
Astorga. Por isso estava daquela cor quando o vi.
Espantado, o rei de Leão ripostou.
-
Não acrediteis nisso, são boatos maliciosos. Aquele rumor nunca fora totalmente
confirmado. Olhando para o príncipe, Afonso VII acrescentou:
-
Também ouvi falar dessa relíqui a que
vosso pai teria escondido.
Afonso Henriques confirmou-lhe a lenda, à
qual nunca dera muita importância.
Aparentemente, o conde Henrique não
revelara a ninguém o segredo.
Ao ouvir o primo falar no pai, o rei ficou
melancólico e suspirou:
-
Mal conheci o meu, Raimundo de Borgonha, e tenho pena. Era mais um traço comum
aos dois.
Raimundo morrera quando Afonso Raimundes
tinha dois anos, e seu primo Henrique de Borgonha falecera quando Afonso
Henriques tinha três.
As mães haviam-nos entregado a ambos nas
mãos de percetores.
Afonso Henriques vivera com a família Moniz de
Ribadouro, e Afonso Raimundes com Pedro Froilaz, conde de
Trava.
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