(Domingos Amaral)
Episódio Nº 181
Ao sair por um túnel diferente daquele por
onde chegara, a mulher de negro que sorria com malícia debaixo do seu capuz,
gritara a Mem:
-
Não vos esqueceis também da promessa que me haveis feito!
Um ano antes, Mem concordara em salvá-la
de um vago “fogo” que supostamente a iria queimar, mas só se aterrou com aquela
profecia quando, algum tempo depois, ouviu os gritos e olhou horrorizado para o
vale.
A bruxa, acabara de lançar a sua bola de
fogo, confundindo Ramiro e o Velho, antes de desaparecer atrás de uma árvores.
Entretanto Fátima lutava com o Rato com um
tronco na mão, mas Zaida e Zulmira não ofereceram resistência ao Peida Gorda,
que lhes indicou a direcção da estrada.
As coisas estavam mais feias do outro
lado. Abu Zhakaria, cerca de vinte metros à frente dos seus mercenários, já
matara o santinho e caía agora sobre o Ameixa, que gritava aterrado, percebendo
que também ia finar-se, pois Zhakaria era formidável com o alfange.
Trespassou a barriga do desgraçado, e
depois baixou-se evitando uma flecha que Ramiro lhe disparara. Quando o
templário se preparava para disparar outra, uma segunda bola de fogo explodiu
ao seu lado obrigando-o e ao Velho a recuar.
Os dois correram na direcção do Rato que
lutava ainda com Fátima. O Velho rasteirou-a e atou-lhe as mão atrás das costas
e o Rato deu-lhe uma estalada, zangado.
-
Cabra mourisca! – gritou.
Ramiro colocou a rapariga aos ombros e os
três homens tomaram o caminho por onde seguira o Peida Gorda, que levara
Zulmira e Zaida à frente da sua lança.
De repente, ouviu-se um urro:
-
Fátima!
Esta desatou aos pontapés a Ramiro, e tal
era a sua violência que ele foi obrigado a pousá-la.
Abu Zhakaria, a cerca de vinte metros, em
cima de um penedo, repetiu o berro:
-
Fátima!
De olhar esgazeado, a rapariga tentou
correr, mas o Rato pregou-lhe uma segunda estalada, que a fez tombar.
Nesse momento, ouviu-se um forte tropel e
apareceu Paio Soares, a cavalo e de espada na mão, seguido por vários
cavaleiros, obrigando os sarracenos a recuarem.
Depois de uma intensa luta, os soldados
regressaram para junto de Ramiro e das mulheres, e durante mais de duas horas
abriram covas para os mortos. Só no final é que partiram, com as mouras presas.
Mem disse-me mais tarde que ficara
desesperado, pois sentiu que falhara, que as perdera.
Triste e desorientado regressou à caverna
para procurar a bruxa. Não a encontrou e embrenhou-se na floresta a caminho da
sua carroça e dos seus jumentos.
Quando chegou ao local onde os deixara,
sentiu um cheiro enjoativo e colocou uma flecha no arco, receoso. Pé ante pé
acercou-se da carroça e viu vultos deitados em cima dela.
Horrorizado, distinguiu os corpos dos
leprosos que com ele haviam atravessado o rio de madrugada.
Via-se sangue por todo o lado, e Mem
reparou que tanto as leprosas que se haviam juntado à barcaça, como o homem que
os havia ajudado na gafaria estavam degolados, as suas cabeças amontoadas a um
canto da carroça, com expressões disformes e terríveis.
Transtornado, desatou a vomitar e começava
a recompor-se quando ouviu uma voz:
-
Foi ele, Mem, o assassin do califa.
A mulher de negro estava sentada no chão,
encostada a uma árvore, a passar umas mesinhas nos braços, já sem o capuz.
Vamos ter que os cremar como fiz com o
vosso pai – disse ela.
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