(Domingos Amaral)
Episódio Nº 217
Atrapalhado, o Trava berrava,
ordenando que alguém chamasse depressa Peres Cativo, para os reforçar.
A decisão não só foi tardia
como inútil, pois Peres Cativo ignorou-a, decidindo não socorrer o meio-irmão que
o apelidara de traidor.
A perícia e coragem do
Lidador desbarataram as primeiras linhas do Trava, que em pouco tempo se viu
cercado. A grande maioria dos seus homens, que havia recuado de mais, nem
sequer chegou a lutar, pois rapidamente se espalhou a notícia de que o Trava
mais novo, tal como o mais velho antes, fora feito prisioneiro.
Entretanto, do outro lado do
campo da Ataca a carga entusiástica de Afonso Henriques e Gonçalo de Sousa, bem
como a superioridade numérica, devastou as tropas de Paio Soares, também elas
surpreendidas pela investida.
Os seiscentos homens que
ainda restavam ao marido de Chamoa foram impotentes para suster os novecentos
portucalenses, e começaram a debandar, deixando o seu chefe vulnerável e apenas
cercado por trinta cavaleiros.
Foi aqui
que se deu a maior matança, pois os homens do príncipe foram implacáveis, aniqui lando a maioria dos adversários em combates
desiguais.
Paio Soares cedo percebeu
que o seu destino estava traçado, mas nem por um momento cedeu. À sua volta vários
adversários caíram, atingidos pela sua espada, até que estando ele a gladiar
com dois deles, ouviu-se um tropel furioso.
Era Afonso Henriques que
carregava, com a arma do pai erguida na mão direita. Vergastou furiosamente
Paio Soares nas pernas, na cara e na barriga, dando-lhe várias estocadas que o
atiraram ao chão.
Mal o Mordomo – Mor tombou
do cavalo ouviu-se um brado geral, e os portucalenses festejaram a sua derrota,
except o Gonçalo porque aquele era um
homem que admirava, apesar de tudo.
Afonso Henriques, já
desmontado, acercou-se de Paio Soares. Este estava ferido, o sangue
escorria-lhe da perna, da cara e da barriga e contorcia-se de dores, já sem o
capacete.
Em sofrimento, balbuciou:
- Sel... sel... um.
Ninguém o percebeu pois a
sua cara encontrava-se totalmente desfigurada pelos golpes e já não conseguia
falar.
Gonçalo fechou os olhos, desolado.
No início da batalha, Paio Soares tivera o príncipe na ponta da espada, mas
poupara-lhe a vida. Porém, Afonso Henriques não retribuíra esse gesto
misericordioso e ferira gravemente o mordomo de sua mãe. Só alguns de nós sabíamos
qual era a razão.
Ao final da tarde , o
príncipe recebera Peres Cativo, que veio apresentar a rendição oficial dos
galegos. Olhou-o curioso e comentou:
- Pelo que vejo não haveis combatido.
Peres Cativo disse que
aquela não era a sua guerra, e Afonso Henriques franzindo a testa perguntou-lhe
se ele não era um Trava.
O seu interlocutor encolheu
os ombros:
- Na Galiza, sou um bastardo.
Então. Afonso Henriques
disse-lhe:
- Podeis ser um dos meus homens. Sei bem da
vossa mestria como guerreiro, e ainda bem para nós que hoje não a haveis usado.
Peres Cativo torceu o nariz,
alegando que a família jamais lhe perdoaria a afronta, o que levou o príncipe a
acrescentar, sorrindo:
- Nem a mim.
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