(Domingos Amaral)
Episódio Nº 34
O bispo Bernardo suspirou,
aquele rapaz conhecia mal a alma humana. Por isso deu-lhe um longo sermão,
sugerindo que seguisse os seus avisados conselhos, coisa que Ramiro aceitou de
imediato, extraindo finalmente do religioso a absolvição desejada a que somou a
obrigação de rezar todas as noites o terço.
Assim farei, prometeu
Ramiro.
Pai, vou mudar...
Terminado o ministério do
sacramento, falaram acerca da busca da relíqui a,
da troca proposta por Ermígio Moniz. Do fossado que se preparava, bem como
sobre as selvajarias que Abu Zhakaria cometera junto ao Nabão.
- Era um local estranho, umas
ruínas macabras. Mesmo que não tivesse lá encontrado os empalados sentiria
receio - confessou Ramiro.
O bispo aconselhou-o a
concentrar-se no seu novo desígnio de pureza, exigindo que voltasse daí a um mês,
para partilhar os progressos. No momento em que o musculado mas frágil templário
se despedia dele, beijando-lhe o anel, ouviram uma porta atrás de ambos a
abrir-se e, para espanto de Ramiro, saíu por ela a princesa Zaida que também se
mostrou surpreendida ao vê-lo.
- Ramiro... – murmurou Zaida,
sem sorrir.
O bastardo de Paio Soares
desviou o olhar, não gostava daquelas raparigas mouras, que tanto trabalho lhe
tinham dado no passado.
Pai, é uma mentirosa...
Para surpresa do bispo
Bernardo, Zaida também não foi, como habitualmente, simpática e afável. Apenas
lhe atirou um adeus apressado, que levou o prelado a comentar, enquanto ela saía
da Sé:
- A Zaida já conhece o livro de Génesis de trás
para a frente. Ramiro confessou a sua falta de estima pelas duas princesas
mouras, mas o bispo repreendeu-o, alegando que ele devia extinguir no seu coração
a animosidade às mulheres, para se ver livre dos seus demónio interiores.
- Com a Zaida é fácil. A irmã
é mais arisca – opinou o bispo.
Para ele era impossível não
gostar de Zaida, nem uma única pessoa tinha algo de mau ou errado a apontar à
rapariga.
É surpreendente como tantos
em Coimbra se equi vocaram em relação
a Zaida. A sua simpatia a todos havia conqui stado,
submergindo a profundidade daquela oculta sabedoria e sobretudo a inteligência
fina dos seus habilidosos estratagemas.
Certas mulheres são assim, a doçura é uma arma de distracção, um manto
amável debaixo do qual se escondem insondáveis propósitos
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