quarta-feira, agosto 17, 2016

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)




Episódio Nº 64




















Depois de praguejar, o wali de Córdova concluiu com nova previsão.

- Se não fosse Temin e a sua guarda sangrenta, o califado de Marraquexe ruiria em poucos meses! Assim, vai demorar uns anos.

Perante tal desagradável cenário, Ismar defendeu que os muçulmanos andaluzes, tinham de tentar acelerar o lento apodrecimento do poder dos almorávidas.

Se conseguissem colocar gente de confiança como o walis de Sevilha e Saragoça, poderiam disputar o futuro.

E Santarém também terá de cair para o nosso lado – murmurou Ismar, olhando fixamente o seu interlocutor.

- Qual a vossa sugestão? – perguntou Zhakaria, curioso.

Com um sorriso, Ismar, levantou-se do seu cadeirão e, sentindo, talvez, que ainda não chegara o momento das revelações, perguntou:

 - Vamos comer?

Inesperadamente, levantou-se a declamar versos na sua voz forte mas nem por isso menos melodiosa:



Eu só quero que me fales
Das cantigas e do vinho
Deixa lá e não te rales
Deus perdoa o descaminho!


Deixa essa gente vã
Com promessas e intrigas
Elas não interessam nada
Pois o meu maior afã
É beber minha golada
De vinho na tarde vã
Ao som das belas cantigas!

Zhakaria riu-se enquanto o governador fazia uma vénia como se agradecesse uma ronda de aplausos, proclamando em seguida:

 - De autoria de Al – Mutamid, antigo rei de Sevilha!

Ao ver Zhakaria franzir a testa, esclareceu:

 - Sim, era o pai de Zaida de Sevilha e o avô de Zulmira. Foi, portanto, o bisavô de Fátima e de Zaida!

Depois, piscando o olho, acrescentou:

 - E grande apreciador de levar na peideira!


Era conhecida a paixão por mancebos do célebre e já falecido monarca de Sevilha, mas Ismar não elaborou mais sobre o assunto, enquanto conduzia o seu convidado pelos corredores de Azzarhat, pejados de vasos dourados e com as pardes forradas de belas pinturas.

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