quinta-feira, agosto 04, 2016

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)




Episódio Nº 54



















Guimarães. Dezembro de 1132



Precisamente no mesmo dia em que as anteriores peripécias ocorriam em Tui, nós festejávamos o nosso último Natal pacífico numa Guimarães engalanada para as festividades.

Há quatro anos e meio que não havia guerra no condado Portucalense, contrariando as promessas bélicas do
Trava.

Afonso VII, primo direito de Afonso Henriques, parecia alheado dos destinos do Condado, aparentemente esquecido da recusa do nosso príncipe em prestar-lhe vassalagem, o que nos permitia quatro anos de bonança.

A prosperidade era visível em todo o lado. Os inúmeros mendigos que antes percorriam Coimbra, Viseu ou Guimarães, em busca de alívio dos seus sofrimentos, quase haviam desaparecido.

O povo, sobretudo os agricultores, enfrentava menos dificuldades do que no passado. As sensatas decisões de Afonso Henriques tinham melhorado as colheitas e os almocreves circulavam livremente nas antigas estradas que os romanos deixaram construídas.

Sinal de que as balbúrdias do passado estavam suspensas, era também a explosão de crianças que se notava. Nas pequenas aldeias, nas almedinas dos principais castelos, corriam petizes alegres e centenas de mães carregavam bebés ao colo, felizes por os poderem alimentar e sem temores quanto ao futuro da região.

Mesmo entre os ricos-homens e os infanções se multiplicavam os nascimentos e também no nosso círculo íntimo havia agora uma nova fornada de novos representantes das famílias.

O Braganção, nosso amigo e senhor de Bragança, já apresentava dois rebentos de sua esposa, a irmã do príncipe, Sancha Henriques, que a maternidade parecia ter amansado, contendo o seu carácter quezilento.

Meu pai. Egas Moniz, tivera também dois petizes, da sua segunda esposa, Teresa de Celanova; e eu próprio era pai de um primeiro filho da minha Maria Gomes, que já esperava um segundo.

A juntar a esses, no Castelo de Guimarães, morava também a filha de Afonso Henriques e Elvira Gualter, a quem o príncipe chamava de Elvira, como a sua mãe normanda, que se somava às irmãs do príncipe, Sancha e Tereza de Trava, filhas de dona Teresa e de Fernão Peres.

O nosso Natal, passava-se pois, repleto de choros infantis e atenções redobradas com recém-nascidos e foi também por isso que, pelo segundo ano consecutivo fui a Tui com a família Trava.

Tempos depois mortifiquei-me fortemente por pensar que tinham sido as minhas decisões que nos haviam prejudicado, mantendo-nos na ignorância sobre os planos de Afonso VII e do Trava.

Mas naqueles derradeiros dias de alegria e paz em Guimarães, Celmes era só um grande motivo de orgulho. Por paradoxal que fosse, apenas o nosso amigo Gonçalo de Sousa, que o príncipe elegera como alcaide desse castelo, não se mostrou contente ao confrontar-se com aquele mosaico de felicidade,

Apesar de nos ter saudado com o seu habitual tudo espeta? -  acrescentou, desapontado, que, pelos vistos, se espetava demais!

- Todos cheios de filhos e eu desterrado em Celmes! – protestou.


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