A NOSTALGIA DE ESTAR SÓ...OU A REFLEXÃO SOBRE UMA EXPERIÊNCIA EMOCIONAL
MACROSCÓPIO 25 DE JULHO
A solidão puxa ao sentimento porque ficamos mais próximos de nós próprios e por isso mais sensíveis, carentes, piegas, românticos e filósofos, além de que é a nossa grande oportunidade para os exercícios de narcisismo como, por exemplo, irmos espreitar ao espelho da casa de banho e olhar para nós como se nunca nos tivéssemos visto e fazer outras coisas ridículas sem corrermos o risco de sermos surpreendidos. São momentos em que podemos apreciar, sem interferências, a nossa própria companhia.
Daqui a necessidade de uma mulher, companheira, pessoa que nos ame e que nos possa deixar sós apenas por coincidência, porque calhou assim…vai tu que a mim não me apetece ir…
Dificilmente concebo a vida sem a companhia de alguém, indispensável para que os momentos em que estou só nada tenham a ver com a solidão, buraco escuro, enorme, a fazer-me sentir perdido sem qualquer espécie de jeito.
E como poderei estar só senão tiver alguém na minha vida, e como poderei fazer esse exercício de transmutação da alma se não estiver só?
Será possível a alguém que não esteja próximo da loucura deixar o corpo na sala dizendo-lhe:
- Deixa-te estar aí, sossegado, que eu vou à janela apreciar o brilho das estrelas lá no céu…sem ter a garantia que passado aquele fim-de-semana, a mulher, que acidentalmente, esteve fora, entra em casa e pergunta-lhe, ternurenta:
- Então, amor, como foram estes dias sem mim?
E eu, ainda atordoado da experiência, sem ter a certeza de ter deixado o corpo deitado na sala, olhos vidrados no teto, enquanto vou receber a mulher à entrada da porta da porta, responderei:
- Bem, muito bem… claro, com muitas saudades tuas… ainda bem que estás de volta…
Não sei bem se este exercício de transmutação da alma pode funcionar como experiência de morte mas se tem a ver com a capacidade de nos escapulirmos da nossa própria vida, então já terei morrido vezes sem conta, e quem não gosta de “morrer” para ir para outro “mundo”, aquele que a nossa imaginação escolher?
Meu caro Rui, já percebeste que falhei completamente na minha experiência de simulação morte, isto não tem nada de sobrenatural nem de filosófico mas então, que hei-de fazer, já quando a tua bisavó, que era dada a essas coisas, me contava histórias de mesas que se levantavam sozinhas e de vozes vindas do outro mundo,… coisas de espiritismo… eu ficava cheio de medo que ainda hoje não consigo ultrapassar completamente?
Deve ter sido pelo medo que sempre tive do outro mundo que resolvi acabar com ele, talvez… se a tua bisavó não me tivesse contado aquelas histórias…mas contou, e por isso, quando cresci, acabei com o outro mundo…varri-o, nunca mais me fará sentir medo nem, por meu intermédio, a qualquer outra criança.
Somos criaturas deste mundo, lindo nos seus momentos de tranquilidade, soberbo e violento quando irado e indisposto mas foi nele que nascemos e vamos morrer e, quem sabe, se algum herdeiro nosso não virá a conhecer outro quando pudermos viajar nos nossos próprios OVNIS?.
1 Comments:
Óbviamente, e não é por seres meu tio, mas ler-te aqui, ouvir-te alí ou conversar contigo acolá é sempre para mim muito mais enriquecedor do que perder oras a fio pastando com doutores e catedráticos da tanga.
Tenho a sorte de seres meu tio, e parece também ter a sorte de ter um tio inteligente.
No fundo, eu não tenho um tio, tenho dois - em um!!
aquele abraço e bem haja pela tua imprevisível reflexão. Afinal, não comenta quem quer, mas quem pode
Teu sobrinho e amigo
Rui
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