segunda-feira, maio 23, 2011

TEREZA

BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA



Episódio Nº 107






Dan a beijou nos olhos, logo na boca, a mão direita escorregando das costas para as ancas, a mão esquerda enfiada nos cabelos de Tereza. Quatro dias se haviam passado do primeiro beijo recebido do moço, mas Tereza ainda o tinha inteiro nos lábios por ocasião do segundo. A voz quente a lhe acender uma fogueira no peito:

- Amanhã é noite de São João – disse Daniel – e o capitão me contou que vai a uma festa que dura a noite toda, entra pelo dia…

- Eu sei, ele vai todo o ano, é no roçado de seu Mundinho Alicate.

- Amanhã esteja às nove da noite no portão dos fundos, às nove em ponto. Vai ser nossa festa de São João.

Novamente a boca e o beijo, Tereza tocou de leve, a medo, nos anéis dos cabelos de Dan, maciez de lã de barriguda. Amanhã nossa festa sem falta.

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Nem sequer a Dóris, esposa legal, quanto mais a Tereza, simples moleca, costumava o capitão informar de seus passos, idas e vindas, pousadas nocturnas, projectos e decisões; não deu nunca a mulher alguma a ousadia de comunicar onde passaria a noite, se em casa com ela, se no serralho de Gabi bebendo cerveja, provando pensionista nova, se em localidade próxima preso aos múltiplos negócios ou a combate de galos – homem que se preza mantém a mulher no devido lugar.

De viagens mais longas, à Bahia ou a Aracaju, Tereza tomava conhecimento nas vésperas, a tempo de lhe arranjar a mala – camisas passadas na perfeição, ternos brancos brilhando no espermacete. Casualmente vinha a saber através de um pedaço de conversa entre o capitão e Chico Meia-Sola, de programada demora na roça para activar os trabalhos; de ida a Cristina para controlar a venda do negro Baptista, do negro só de nome, dinheiro e mercadorias de Justiniano; de noites inteiras aqui e ali, nos fandangos em casas conhecidas, em povoados e plantações, sendo ele bom dançador sempre disposto a um arrasta-pé e sendo tais dancinhas os melhores postos de recrutamento de verdes meninas, no ponto exacto do capitão. Noites de descanso para Tereza.

Da festa de São João, em casa de Raimundo Alicate, numa lavoura distante, em terras da usina. Tereza sabia, pois o capitão não falhava, presença principal e infalível todos os anos. Esse Mundinho Alicate, protegido dos Guedes, espoleta de Justiniano, era figura popular na região além de lavourar cana de açúcar, vendia cachaças, algumas ditas afrodisíacas, catuaba, pau-de-resposta, num galpão nos fundos da casa, recebia caboclos, à frente dos quais o caboclo Rompe Mato; por isso o conheciam também por Raimundo Rompe-Mato ou Mundinho de Obatualá, pois se dizia feito em santo angola na Bahia pelo falecido baba-lorixá Bernardino do Bate-Folha. Tudo isso e mais as raparigas que arrebanhava e fornecia ao capitão e a outras pessoas gradas (reservando para os Guedes da usina as mais atractivas, segundo voz corrente, à pensão de Gabi e a diversos covis da Guia Dágua.

Festeiro sem rival, atravessava o mês de Junho com forros em casa, no galpão dos caboclos, salvando Santo António, São João, São Pedro. Festa maior a de São João, com grande fogueira, montanhas de milho, rojões de fogueira, salvas de morteiro, estouro de bombas e a dança arretada. Vinha gente de toda a redondeza, a cavalo, em carro de boi, a pé, de caminhão e de Ford. (clik na imagem e aumente)

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