quarta-feira, agosto 17, 2011

TEREZA

BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA






Episódio Nº 181




No dia seguinte, na hora do passeio, coube a ele perguntar:

- E minha flor, cadê? Não preciso dela para me lembrar de ti, mas é como se eu te levasse comigo.

Nas sucessivas despedidas, na renovada tristeza, quando ele ia tomar o automóvel e partir, Tereza beijava uma rosa e com alfinete a prendia à botoeira do paletó – na mão de Emiliano de novo o rebenque de prata.

O rebenque na mão, a rosa na botoeira, o beijo do adeus – a carícia do bigode, a ponta da língua a tocar-lhe os lábios – lá se vai o doutor à sua numerosa vida, longe de Tereza. Quando regressar à paz de Estância, hóspede de curta permanência, dividido entre tantas moradias, entre tantos compromissos, interesses e afectos, cabendo à Tereza o tempo de uma rosa desabrochar e fenecer, o tempo secreto e breve das amásias.

14

Do aprendizado dos vinhos licorosos e dos licores passara Tereza ao capítulo mais difícil dos vinhos de mesa, dos destilados fortes, dos amargos digestivos. Num dos quartos de fora da casa o doutor arrumara uma espécie de adega, exibida com vaidade a João Nascimento Filho e ao padre Vinícius, rótulos examinados com respeito, datas pronunciadas com devoção. Fiel à cerveja e à cachaça, Lulu Santos servia de alvo a zombarias: bárbaro sem a noção de gosto, para quem o uísque era o supra-sumo.

Tereza não fez grande carreira no labirinto das bebidas, permanecendo fiel às descobertas iniciais: o Porto, o Cointreau, o Moscatel, embora aceitando os amargos antes da comida. Vinhos de mesa, de preferência os adocicados, de buquê marcante a perfumar a boca.

O doutor exibia os nobres vinhos secos, os tintos ilustres, safras escolhidas, o padre e João Nascimento Filho reviravam os olhos, desfazendo-se vem exclamações, mas Tereza deu-se conta na continuidade dos jantares de que mestre Nascimento, com fama de conhecedor e de apurado gosto, também ele preferia os brancos menos secos, mais leves e de mais fácil paladar, apesar dos elogios aos secos e aos tintos e ao estalar da língua ao servir-se deles. Preferindo sobretudo os licorosos a qualquer outro aperitivo, Tereza nunca lhe traiu o segredo, nem deixou que ele percebesse a descoberta da intrujice snobe:

- O senhor me acompanha num cálice de Porto mesmo não sendo a hora certa, seu João? – Mais que depressa ele recusava o gim, o uísque, o bitter.

- Com prazer, Tereza. Isso de hora é requinte de fidalgo. Não tendo como mestre Nascimento Filho obrigações de fino gosto, e não sendo de mentir desnecessariamente, ela revelava ao doutor suas predilecções e Emiliano, sorrindo, lhe dizia: favo-de-mel Tereza.

Nas cálidas noites de Estância de amena viração, brisa dos rios, no céu de estrelas sem conta, a lua desmedida sobre as árvores, ficavam no jardim a bebericar, ela e o doutor. Ele nas fortes aguardentes, na Genebra, no Vodka, no conhaque, ela no vinho do Porto ou no Cointreau. Favo-de-mel, Tereza, teus doces lábios. Ai, meu senhor, seu beijo queima, chama de Conhaque, brasa de Genebra. Nessas horas, a distância a separá-los se tornava mínima até desaparecer na cama por completo. Na cama ou ali mesmo no balanço da rede à viração, sob as estrelas. Árdegos partiam para alcançar a lua.

A residência sofrera alterações para torná-la ainda mais confortável, estando o doutor habituado ao melhor e querendo habituar Tereza.
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