quinta-feira, janeiro 03, 2013

O cacau pode já ser carregados directamente para o seu destino

GABRIELA
CRAVO
E
CANELA

Episódio Nº 180

Chão de Gabriela

Diversas vezes retardados, terminaram por fim, os trabalhos da barra. Um novo canal, profundo e sem desvios, fora estabelecido. Por ele podiam passar sem perigo de encalhe os navios Lloyd, do Ita, da Baiana e, sobretudo, podiam entrar no porto de Ilhéus os grandes cargueiros para receber directamente ali os sacos de cacau.

Como explicou o engenheiro-chefe, a demora na conclusão das obras deveu-se a inúmeras dificuldades e entraves. Não se referia aos barulhos cercando a chegada dos rebocadores e técnicos, àquela noite de tiros e garrafadas no cabaré, às ameaças de morte iniciais.

Aludia às inconstantes areias da barra: com as marés, os ventos, os temporais, moviam-se elas, mudavam o fundo das águas, cobriam e destruíam em poucas horas o trabalho de semanas. Era preciso começar e recomeçar, pacientemente, mudando vinte vezes o traçado do canal, buscando os pontos mais defendidos.

Chegaram os técnicos, em determinado momento, a duvidar do sucesso, tomados de desânimo, enquanto a gente mais pessimista da cidade repetia argumentos da campanha eleitoral: a barra de Ilhéus era um problema insolúvel, não tinha jeito.

Partiram rebocadores e dragas, os engenheiros e os técnicos. Uma das dragas ficou permanente no porto para atender com presteza às movimentadas areias, para manter o canal aberto à navegação de maior calado.

Uma grande festa de despedida, cachaçada monumental, iniciando-se no Restaurante do Comércio, terminando no Eldorado, celebrou o feito dos engenheiros, sua pertinácia, sua capacidade profissional.

O Doutor esteve à altura da sua fama no discurso de saudação, em que comparou o engenheiro – chefe a Napoleão mas «um Napoleão das batalhas da paz e do progresso, vencedor do mar aparentemente indomável, do rio traiçoeiro das areias inimigas da civilização, dos ventos tenebrosos», podendo contemplar com orgulho, do alto do farol da ilha de Pernambuco o porto de Ilhéus por ele «libertado da escravidão da barra, aberto a todas as bandeiras, a todos os navios, pela inteligência e dedicação dos nobres engenheiros e competentes técnicos».

Deixavam saudades e raparigas. No cais de despedidas, choravam mulheres dos morros, abraçando os marinheiros. Uma delas estava grávida. O homem prometia voltar. O engenheiro-chefe levava preciosa carga da boa «Cana de Ilhéus», além de um macaco jupará para recordar-lhe no Rio essa terra de dinheiro farto e fácil, de valentias e duro trabalho.

Partindo eles quando começavam as chuvas, pontuais naquele ano, caindo bem antes da festa de São Jorge. Nas roças floriam os cacaueiros, milhares de árvores jovens davam os seus primeiros frutos, anunciava-se ainda maior a nova safra, subiriam ainda mais os preços, aumentaria o dinheiro a correr nas cidades e povoados, não havia lavoura igual em todo o país.

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