quinta-feira, dezembro 11, 2014

Não eram da mesma laia...
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)

Episódio Nº 121















Apaixonado pela formosura do lugar, confiante em seu amanhã, decidira fixar-se naquela nascente encruzilhada de tropeiros.

Freguesia assegurada, o ganho dava para viver e juntar os tostões com que pagar o empréstimo do Coronel. Desobrigado para sempre da necessidade de alugar a força dos braços, a destreza das mãos, o tutano da cachola.

 No Recôncavo tudo estava pronto e acabado; ali tudo estava por ser feito.

Quando acendeu a fornalha, manejou o fole e abateu o malho sobre a bigorna, quando levantou a pata do burro Charuto para nela colocar ferradura nova arrancando vivas da assistência - putas, tropeiros, jagunços, seu Fadu e Pedro Cigano.

Tocaia Grande apenas passara de concorrido porém desabitado pouso de tropas de cacau seco, a mísero arruado: na Baixa dos Sapos as choças de palita das putas, no Caminho dos Burros casebres de barro batido, além do barracão do coronel Robustiano e da casa do turco, animado comércio de cachaça, fumo e rapadura.

Foi depois da chegada de Castor que se somaram à carreira de casebres, no Caminho dos Burros, algumas casas de tijolo e telha-vã. Com a construção da oficina, o arruado ampliou-se, cresceu em lugarejo, acolhendo novos moradores: pedreiros e ajudantes, carpinas e raspa-tábuas.

 Da mesma maneira que Lupiscínio e Bastião da Rosa, contratados antes por Fadul, também mestre Balbino e mestre Guido, Zé Luiz com sua mulher, Merência, chegaram em carácter provisório na intenção de permanecer apenas a duração da empreitada, foram ficando.

Balbino, pedreiro de ofício, mestre-de-obras, Guido, marceneiro: marceneiro e não carpina, como frisava, com uma ponta de vaidade.

Zé Luiz e Merência, ele atarracado e beberrão, ela grandalhona e emproada, haviam improvisado um forno no qual queimaram as telhas para a casa de Castor.

 Para atender encomenda maior do coronel Robustiano de Araújo, ampliaram a incipiente olaria, barro de primeiríssima qualidade.

Tendo decidido ficar de vez, Merência, cabeça do casal, tratou de erguer casa de alvenaria para nela alojar-se com o marido: na palhoça junto ao forno, Zé Luiz escapara por milagre de ser mordido por uma jararacuçu.

 Para os lados do rio, na Baixa dos Sapos, existiam lugares lindos, mas ela preferiu construir no Caminho dos Burros, ao lado do barraco de Lupiscínio; distante dos ranchos das putas, ruidoso reduto de pecado e bandalheira.

 A condição de mulher casada não a impedia de dar-se com as raparigas, não lhes negava o bom-dia e o boa-tarde, mas daí a ser vizinha de rameiras ia uma distância grande: não eram da mesma laia.

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