segunda-feira, novembro 30, 2015

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)


Episódio Nº 122


















Quando Zulmira estava prestes a fazer quinze anos, veio ao mundo o seu meio irmão Sancho, o primeiro varão do Imperador de Hispânia!

Odiei-o desde o primeiro dia – confessou Zulmira.

Espantada, a filha Zaida perguntou:

- Porquê?

Zulmira suspirou, as antigas emoções já vazias de significado.

Quando jovens somos loucos de ciúmes.

Na verdade, odiava Toledo, os cristãos, Afonso VI. Órfã de pai, muçulmana numa corte cristã, recusava assimilar os costumes da capital da Hispânia.

Ao contrário da mãe, que se convertera à Bíblia, Zulmira mantinha-se fiel ao Corão.

Nesse momento, Fátima olhou para a sua irmã Zaida, com um sorriso triunfante, mas a outra fez-lhe uma careta. Sem ligar às diatribes silenciosas das filhas, Zulmira prosseguiu:

- Para mais Afonso VI nunca ajudou meu avô Al-Mutamid.

Tempos depois surgiu a segunda notícia fatal: Sevilha fora também tomada pelos almorávidas de Yusuf, e Al-Mutamid tinha sido levado preso para Marraquexe, onde morreria.

A minha raiva tornou-se gigantesca – confessou Zulmira. Ainda mais enfurecida ficou quando Afonso VI se passou a intitular “Imperador das Duas Religiões” argumentando que o seu herdeiro legítimo, o príncipe Sancho, era tão cristão como muçulmano.

 - Era o cúmulo da afronta! – exclamou.

Como Zulmira viria a descobrir, não era a única a ter esses sentimentos não era a única a ter tais sentimentos. Os nobres e os bispos de Castela e Leão abominavam aquela farsa da união das duas religiões, e a hostilidade ao varão do Imperador crescia, contaminando Dona Urraca e Dona Teresa iradas por terem sido ultrapassadas por Sancho na linha de sucessão.

Certo dia quando Zulmira passeava pelas ruas de Toledo, dois homens obrigaram-na a segui-los. Fora levada a uma casa e, num ambiente escuro, tinham-lhe proposto um sinistro acordo.
Desafiaram-na a matar o meio irmão Sancho, coisa que ela podia fazer facilmente, pois circulava à vontade na corte. Em troca, o grupo dos conspiradores garantia-lhe protecção contra a fúria de Afonso VI.

Zulmira suspirou e depois disse:

 - Não posso jurar, pois não lhes vi bem as caras mas suspeito que entre aquelas pessoas estavam Dona Urraca e Dona Teresa.

Zaida levou a mão à boca, compreendendo o perigo que ainda corria a mãe. Se um dia a reconhecesse, Dona Teres podia mandar matá-la.

 - Há nove anos em Coimbra achei que ela me identificara, mas depois percebi que não – recordou Zulmira. Mas outros podem fazê-lo, por isso não fui a Ricobayo nem a Toledo e fingi doenças.
                                                          

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