(Domingos Amaral)
Episódio Nº 122
Quando Zulmira estava
prestes a fazer qui nze anos, veio ao
mundo o seu meio irmão Sancho, o primeiro varão do Imperador de Hispânia!
Odiei-o desde o primeiro dia
– confessou Zulmira.
Espantada, a filha Zaida
perguntou:
- Porquê?
Zulmira suspirou, as antigas
emoções já vazias de significado.
Quando jovens somos loucos
de ciúmes.
Na verdade, odiava Toledo,
os cristãos, Afonso VI. Órfã de pai, muçulmana numa corte cristã, recusava
assimilar os costumes da capital da Hispânia.
Ao contrário da mãe, que se
convertera à Bíblia, Zulmira mantinha-se fiel ao Corão.
Nesse momento, Fátima olhou
para a sua irmã Zaida, com um sorriso triunfante, mas a outra fez-lhe uma
careta. Sem ligar às diatribes silenciosas das filhas, Zulmira prosseguiu:
- Para mais Afonso VI nunca
ajudou meu avô Al-Mutamid.
Tempos depois surgiu a
segunda notícia fatal: Sevilha fora também tomada pelos almorávidas de Yusuf, e
Al-Mutamid tinha sido levado preso para Marraquexe, onde morreria.
A minha raiva tornou-se
gigantesca – confessou Zulmira. Ainda mais enfurecida ficou quando Afonso VI se
passou a intitular “Imperador das Duas Religiões” argumentando que o seu
herdeiro legítimo, o príncipe Sancho, era tão cristão como muçulmano.
- Era o cúmulo da afronta! – exclamou.
Como Zulmira viria a
descobrir, não era a única a ter esses sentimentos não era a única a ter tais
sentimentos. Os nobres e os bispos de Castela e Leão abominavam aquela farsa da
união das duas religiões, e a hostilidade ao varão do Imperador crescia,
contaminando Dona Urraca e Dona Teresa iradas por terem sido ultrapassadas por
Sancho na linha de sucessão.
Certo dia quando Zulmira
passeava pelas ruas de Toledo, dois homens obrigaram-na a segui-los. Fora
levada a uma casa e, num ambiente escuro, tinham-lhe proposto um sinistro
acordo.
Desafiaram-na a matar o meio
irmão Sancho, coisa que ela podia fazer facilmente, pois circulava à vontade na
corte. Em troca, o grupo dos conspiradores garantia-lhe protecção contra a fúria
de Afonso VI.
Zulmira suspirou e depois
disse:
- Não posso jurar, pois não lhes vi bem as
caras mas suspeito que entre aquelas pessoas estavam Dona Urraca e Dona Teresa.
Zaida levou a mão à boca,
compreendendo o perigo que ainda corria a mãe. Se um dia a reconhecesse, Dona
Teres podia mandar matá-la.
- Há nove anos em Coimbra achei que ela me
identificara, mas depois percebi que não – recordou Zulmira. Mas outros podem
fazê-lo, por isso não fui a Ricobayo nem a Toledo e fingi doenças.
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