(Domingos Amaral)
Episódio Nº 162
Assustada, a criança desatou de novo a
chorar, mas Zulmira não qui s
contrariar a mãe e deitou-a.
Alterada, Dona Teresa, apontava-lhe o
dedo, com o olhar esgazeado.
-
Eu lembro-me!
Zulmira sentiu-se a gelar por dentro. Dez
anos antes, Dona Teresa, tivera um momento de hesitação, mas não a reconhecera.
Contudo a sua memória avivara-se ao vê-la pegar num bebé, como sua mãe Zaida
fazia também ao seu meio irmão Sancho, muitos anos antes, em Toledo.
Zulmira empalideceu, o seu coração
agitado.
- Dona Teresa, não sei de que falais, de
certo me haveis confundido!
A rainha, com os olhos a brilharem de
malícia, fixava-a.
- Zulmira... A filha de Zaida, a moura que
casou com meu pai! A que odiava cristãos! Por isso haveis sido escolhida para
matar o meu irmão Sancho!
Zulmira aterrou-se: Dona Teresa irá
acusá-la de ter conspirado no passado contra o filho varão de Afonso VI ou,
ainda pior do que isso, de desejar a morte da recém nascida, Sanchinha, cujo
pai era Fernão Peres de Trava!
Espantada a rainha perguntou:
-
Para onde haveis fugido? Corremos Toledo à vossa procura! Pensámos que alguém
vos tinha morto e deitado o corpo ao rio. Mas aqui
estais Zulmira.
E a vossa filha chama-se Zaida, como a
vossa mãe! Só agora que vos vi a pegar na Sanchinha, é que me lembrei!
Baixando o tom de voz, rosnou:
- -
Devíamos ter-vos morto em Toledo.
De repente, Zulmira ajoelhou-se à sua
frente e pediu:
-
Dona Teresa, acreditai, não ia fazer mal à vossa filha! Ouvi-a chorar e tentei
aliviá-la. Não sei do que falais!
Dona Teresa olhou-a já com dúvidas.
Negais ser a filha de Zaida, a barregã de
meu pai, o imperador Afonso VI?
Atraído pelo discurso entrou no quarto
Fernão Peres, que perguntou o que ali se passava. Dona Teresa não lhe contou o
que acontecera em Toledo, nem revelou que estivera envolvida numa conspiração
para matar o seu irmão Sancho.
Apenas exclamou:
- Esta moura odeia cristãos, e vi-a pegar
na Sanchinha!
Fernão Peres sabia que Zulmira nunca
fizera mal a ninguém, muito menos a uma criança, e por isso perguntou:
- E
que mal tem?
A rainha olhou para ele zangada.
Uma mãe sabe bem quem quer o mal dos seus
filhos!
O Trava tentou acalmá-la.
Teresa, ela estava com vossa filha ao
colo, não haveis gostado. É natural, sois a mãe, mas... Zulmira não deseja mal
à Sanchinha!
Dona Teresa hesitou, a sua acusação não
era sólida. Então ordenou:
-
Ide para o vosso quarto, mulher! Depois decidirei o que vos fazer!
Zulmira abandonou o local de cabeça baixa,
ouvindo a rainha gritar nas suas costas:
-
Devíamos matá-las! Soure já foi atacada por causa delas!
Nervosa a moura correu aos fundos do
castelo, e ao virar a esqui na, num
dos corredores, chocou com Manuel Salomão, o cónego moçárabe que lhe tinha
estima, que disse, atrapalhado:
-
Desculpai-me Zulmira!
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