segunda-feira, janeiro 25, 2016

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)

Episódio Nº 162



















Assustada, a criança desatou de novo a chorar, mas Zulmira não quis contrariar a mãe e deitou-a.

Alterada, Dona Teresa, apontava-lhe o dedo, com o olhar esgazeado.

 - Eu lembro-me!

Zulmira sentiu-se a gelar por dentro. Dez anos antes, Dona Teresa, tivera um momento de hesitação, mas não a reconhecera. Contudo a sua memória avivara-se ao vê-la pegar num bebé, como sua mãe Zaida fazia também ao seu meio irmão Sancho, muitos anos antes, em Toledo.

Zulmira empalideceu, o seu coração agitado.

- Dona Teresa, não sei de que falais, de certo me haveis confundido!

A rainha, com os olhos a brilharem de malícia, fixava-a.

- Zulmira... A filha de Zaida, a moura que casou com meu pai! A que odiava cristãos! Por isso haveis sido escolhida para matar o meu irmão Sancho!

Zulmira aterrou-se: Dona Teresa irá acusá-la de ter conspirado no passado contra o filho varão de Afonso VI ou, ainda pior do que isso, de desejar a morte da recém nascida, Sanchinha, cujo pai era Fernão Peres de Trava!

Espantada a rainha perguntou:

 - Para onde haveis fugido? Corremos Toledo à vossa procura! Pensámos que alguém vos tinha morto e deitado o corpo ao rio. Mas aqui estais Zulmira.

E a vossa filha chama-se Zaida, como a vossa mãe! Só agora que vos vi a pegar na Sanchinha, é que me lembrei!

Baixando o tom de voz, rosnou:

 - - Devíamos ter-vos morto em Toledo.

De repente, Zulmira ajoelhou-se à sua frente e pediu:

 - Dona Teresa, acreditai, não ia fazer mal à vossa filha! Ouvi-a chorar e tentei aliviá-la. Não sei do que falais!

Dona Teresa olhou-a já com dúvidas.

Negais ser a filha de Zaida, a barregã de meu pai, o imperador Afonso VI?

Atraído pelo discurso entrou no quarto Fernão Peres, que perguntou o que ali se passava. Dona Teresa não lhe contou o que acontecera em Toledo, nem revelou que estivera envolvida numa conspiração para matar o seu irmão Sancho.

Apenas exclamou:

- Esta moura odeia cristãos, e vi-a pegar na Sanchinha!

Fernão Peres sabia que Zulmira nunca fizera mal a ninguém, muito menos a uma criança, e por isso perguntou:

 - E que mal tem?

A rainha olhou para ele zangada.

Uma mãe sabe bem quem quer o mal dos seus filhos!

O Trava tentou acalmá-la.

Teresa, ela estava com vossa filha ao colo, não haveis gostado. É natural, sois a mãe, mas... Zulmira não deseja mal à Sanchinha!

Dona Teresa hesitou, a sua acusação não era sólida. Então ordenou:

 - Ide para o vosso quarto, mulher! Depois decidirei o que vos fazer!

Zulmira abandonou o local de cabeça baixa, ouvindo a rainha gritar nas suas costas:

 - Devíamos matá-las! Soure já foi atacada por causa delas!

Nervosa a moura correu aos fundos do castelo, e ao virar a esquina, num dos corredores, chocou com Manuel Salomão, o cónego moçárabe que lhe tinha estima, que disse, atrapalhado:

 - Desculpai-me Zulmira!

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